sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Os banhos de lua de Sabina, por Anaïs Nin

"Nessa noite, recordou-se dos banhos de lua, como se isso tivesse marcado o início de sua vida, em vez dos pais, da escola, do lugar de nascimento. Como se eles tivessem determinado o curso de sua vida mais do que a herança ou imitação dos pais. Nos banhos de lua talvez estivesse a motivação secreta de seus atos.

Aos dezesseis anos, Sabina tomava banhos de lua, sobretudo porque todos os outros tomavam banhos de sol e, em segundo lugar, reconhecia ela, porque lhe haviam dito que era perigoso. Era desconhecido o efeito dos banhos de lua, mas se insinuava que podia ser o oposto dos efeitos do sol.

Estava amedrontada na primeira vez em que se expôs. Quais seriam as consequências? Havia muitos tabus contra se olhar para a lua, muitas lendas antigas sobre os efeitos malignos de se dormir ao luar. Ela sabia que a lua cheia era agudamente perturbadora para os loucos, que alguns deles retomavam aos hábitos animais de uivar para a lua. Sabia que na astrologia a lua governava a vida noturna do Inconsciente, invisível à consciência.

Mas então ela sempre preferira a noite ao dia. O luar caía diretamente sobre sua cama no verão. Ela ficava deitada nua ao luar, durante horas, antes de cair no sono, perguntando-se o que seus raios iriam fazer-lhe à pele, ao cabelo, aos olhos e, depois, mais profundamente, aos sentimentos.

Nesse ritual, parecia-lhe que a pele adquiria um brilho diferente, um brilho noturno, uma luminosidade artificial que somente apresentava seu mais pleno fulgor à noite, na luz artificial. As pessoas percebiam isso e lhe perguntavam o que estava acontecendo. Algumas sugeriam que ela estava usando drogas.

Isso acentuava-lhe o amor ao mistério. Ela meditava sobre este planeta, que mantinha metade de si no escuro. Sentia-se ligada a ele porque era o planeta dos amantes. A atração que sentia por ele, o desejo de banhar-se em seus raios explicavam sua repulsa a ter um lar, marido e filhos. Começou a imaginar que conhecia a vida que tinha lugar na lua. Sem lar, sem filhos, com amantes livres, nem mesmo ligados um ao outro.

Os banhos de lua cristalizaram muitos dos desejos e orientações de Sabina. Até este momento, ela experimentara apenas uma simples rebelião contra as vidas que a cercavam, mas então começou a ver as formas e cores de outras vidas, reinos muito mais profundos, estranhos e remotos a serem descobertos, e percebeu que sua recusa à vida comum tinha um propósito: despachá-la qual foguete em direção a outras formas de existência. A rebelião era apenas a fricção elétrica acumulando uma carga de energia que a lançaria no espaço.

Compreendeu por que se irritava quando as pessoas falavam da vida como sendo uma. Tinha certeza de miríades de vida dentro de si. Seu sentido de tempo alterou-se. Sentiu vividamente e com aflição a brevidade do período físico da vida. A morte encontrava-se terrivelmente próxima, e as jornadas em direção a ela eram vertiginosas, mas somente quando levava em consideração as vidas a sua volta, aceitando-lhes os horários, relógios, medições. Tudo o que faziam contraía o tempo. As pessoas falavam de um nascimento, uma infância, uma adolescência, um romance, um casamento, uma maturidade, um envelhecimento, uma morte e, então, transmitiam o ciclo monótono a seus filhos. Mas Sabina, ativada pelos raios lunares, sentia germinar dentro de si o poder de entender o tempo nas ramificações de uma miríades de vidas e amantes, para expandir a jornada para o infinito, fazendo imensas e voluptuosas voltas como cortesã depositária de múltiplos desejos. As sementes de muitas vidas, lugares, de muitas mulheres dentro de si foram fecundadas pelos raios lunares, porque vinham desta vida noturna ilimitada, que geralmente percebemos apenas em nossos sonhos, os quais contém raízes que se estendem a todas as magnificências do passado, transmitindo os ricos sedimentos ao presente, projetando-os ao futuro."

Anaïs Nin, mais um trecho do livro Uma Espiã na Casa do Amor.

Sabina, por Anaïs Nin


"Por que sou amada por ele? Será que ele continua me amando? Seu amor é por algo que não sou. Não sou suficientemente bela, não sou boa, não sou boa para ele, ele não deveria me amar, eu não mereço, vergonha, vergonha, vergonha por não ser suficientemente bela, há tantas outras mulheres muito mais belas, com rostos radiantes e olhos claros. Alan diz que meus olhos são lindos, mas não posso vê-los, para mim eles são olhos mentirosos, minha boca mente, há apenas algumas horas estava sendo beijada por outro. Ele está beijando a boca beijada por outro, está beijando olhos que adoraram outro... vergonha... vergonha... vergonha... as mentiras... as mentiras... As roupas que ele está pendurando para mim com tanto cuidado foram acariciadas e amarrotadas por um outro, um outro que era tão impaciente que amarrotava e puxava meu vestido com violência. Não tinha tempo para me despir. É esse o vestido que ele está pendurando com carinho. Posso esquecer o dia de ontem, esquecer a vertigem, essa selvageria, posso voltar para casa e nela permanecer? Às vezes não consigo suportar as rápidas mudanças de cena, as transições rápidas, não consigo fazer calmamente as mudanças de um relacionamento para o outro. Algumas partes de mim são arrancadas como um fragmento, voam aqui e ali. Perco partes vitais de mim, uma parte de mim permanece naquele quarto de hotel, uma parte de mim afasta-se deste local de abrigo, uma parte de mim está seguindo um outro enquanto ele desce a rua sozinho, ou talvez não sozinho: alguém pode tomar o meu lugar ao seu lado, enquanto estou aqui, esta será minha punição, e alguém ocupará o meu lugar aqui quando eu partir. Sinto-me culpada por deixar cada um deles sozinho, sinto-me responsável por eles estarem sozinhos, duas vezes culpada com relação a ambos os homens. Onde quer que esteja, estou em muitas peças, sem ousar juntá-las, assim como não ousaria juntar os dois homens. Agora estou aqui, onde não serei ferida, pelo menos durante alguns dias não serei ferida de maneira alguma, por nenhuma palavra ou gesto... mas não sou toda eu que estou aqui, apenas metade de mim está sendo protegida. Bem, Sabina, você fracassou como atriz. Você rejeitou a disciplina, a rotina, a monotonia, as repetições, qualquer esforço sustentado, e agora tem um papel que precisa ser mudado a cada dia para proteger um ser humano do sofrimento. Lave seus olhos mentirosos e seu rosto mentiroso, vista as roupas que ficaram em casa, que são dele, batizadas por suas mãos, interprete o papel de uma mulher inteira, pelo menos você sempre desejou ser isso, não é uma mentira completa..."



Anaïs Nin, Uma Espiã na Casa do Amor

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

História (devassa) da humanidade


Pesquisando imagens da humanidade na internet, exatamente sob este título: "humanidade", para colocar aqui, neste humilde Blog, em um texto meu que carrega esta mesma nomenclatura, eis que me deparo com esta imagem. Pensei: "estou aqui postando meus textos antigos que falam sobre Lilith, devassidão, etc, preciso dar um jeito de colocar esta imagem ali também... Choca? Sim, de fato, choca, a uma primeira olhada. Mas mente? Não, mentir, não mente. O sexo atravessou e fez parte da humanidade ao longo da nossa história. "Crescei-vos e multiplicai-vos"(Gn, 1:28) Mas eis que encontramos, através de Eva (não adianta, não vou com a cara dela) e da árvore da vida, que nos fez compreender as Ciências, um outro sentido para a relação sexual, eis que o sexo passa a servir para outras coisas (mais gostosas) do que somente gerar mais gente para sofrer neste mundinho cruel. É instintivo. faz parte da gente, assim como precisamos comer e dormir. Questão de sobrevivência mesmo. A realidade é que sexo é bom mesmo e felizes daqueles que são bem resolvidos o suficiente para admitirem isso. Eu adoro! Sexo bom, sexo pegado. Daqueles que deixam a gente acabado por, pelo menos, uns dois dias... Suor, beijos ardentes, tesão... Multiplicar? Talvez, faz parte também. Mas com responsabilidade. Eu, como já dei a minha singela contribuição para perpetuação da espécie, hoje sou mais adepta do sexo pelo sexo mesmo. Quem não gosta que atire a primeira pedra. Carolas e santinhas de plantão que me perdoem, mas não tenho vergonha de dizer. Sou aquela que vocês verão em um carro qualquer, a qualquer hora do dia, dando uns amassos. Sou aquela que vai demorar mais no banheiro porque está dando uns pegas... talvez, quem sabe, até em um dos seus namorados... sim, isso mesmo... porque, enquanto você está preocupada com as calorias que está ingerindo durante o dia, os homens estão buscando mulheres de verdade para fazerem um bom sexo, mulheres que não se limitam à beleza física, mulheres que são sexys até mesmo com a roupa da faxina. Sinto se sou uma delas... Sinto por vocês, não por mim... Porque sei que sexo, aquele instintivo, aquele animal mesmo, nunca irá me faltar. Mas não esquentem suas cabecinhas vazias, de vez em quando sobra um pouco para vocês. Mas só um pouco.

Carina, 25/01/2010.

Algumas reflexões minhas...

Hoje acabei a leitura do livro. Penso que me libertei das amarras, a falsa moralidade social já não mais me afeta como antes. Na realidade, penso que sempre tive uma ponta de inveja destas mulheres que não tiveram medo de ousar, de deixar o tesão falar mais alto que a razão, enfim, de enfrentar o desconhecido.
O que sempre me impediu de transcender foi eu mesma... Por medo. É, porque nunca liguei muito para as regras e convenções sociais, pelo contrário, sempre me fez muito bem ironizá-las e, de certa forma, combatê-las. Questionar o sistema faz parte da minha vida, desde que me conheço por gente.
Mas a questão que me vem agora não é esta, definitivamente não. O que me pergunto agora é como vim parar aqui? Nunca tive vocação para ser mãe de família, honesta e recatada... Minha devassidão, minha Lilith, ficou em algum lugar em mim, distante e esquecida...



Dia 05/01/2007.

Estou cansada... Deus sabe o preço que pago, que sempre paguei. Por minhas escolhas, os caminhos tortos que percorri e ainda percorro... Acho que não era pra mim. Não consigo ser forte o tempo todo.

Dia 20/05/2007.

A lua cheia há alguns dias me deixa inquieta. Já não sou mais o suficiente para mim mesma... Espaços vazios... E uma inspiração doida que me faz querer escrever, mas não para mim, não em segredo. Quero escrever para outra pessoa, mas, no entanto, acho que ninguém compreenderia.
Minha Lilith está desperta! Mais uma vez. E já não posso sentir que tipo de destruição está causando aqui dentro ou que mudanças trará consigo. Mas é tão forte, tão intenso... Me consome quase que por inteiro...


Dia 03/06/2007.

Penso que há algo em mim que me afasta das pessoas e as afasta de mim. Mesmo junto, mesmo perto, me sinto só e essa solidão cresce cada vez mais e mais e faz com que eu não chore quando tenho vontade, acaba com a empatia, me faz gélida diante de meus próprios sentimentos. O conhecimento nos distancia pouco a pouco das pessoas.


Carina, dia 05/06/2007.

Perdida de mim mesma...



Há dias que penso em escrever, mas não consigo... Os amigos, os verdadeiros amigos, me fazem falta, pois não consigo pedir por socorro. É estranho, mas as pessoas ao meu redor não conseguem ver a tristeza que há em meu silêncio, a carência em minha distância. E assim vou me perdendo. De tudo. De todos. Coloco os fones nos ouvidos e já não faço mais parte deste mundo. Olho até a minha própria vida como se fosse um filme. A diferença é que a trilha sonora quem escolhe sou eu.
A verdade é que o medo me paralisa. Há coisas que às vezes acontecem e que fazem com que eu fique arredia. Mesmo não querendo, desconfio. Desconfiando, me afasto. Me afastando, me perco. E não tem jeito, o medo de sofrer novas decepções e perdas faz com que eu fique assim, dessa maneira que, aos olhos dos outros, parece mesquinha e egoísta. Mas é minha defesa - luto com as armas que tenho.
A dor, bom, esta vai se fazendo física e intensifica meu sofrimento - exatamente o que tento evitar. Mas, como disse alguém uma vez, "só não sofrem aqueles que não vivem". -> E o que seria da vida se esta fosse sempre morna e medíocre?! Temos que, pelo menos, viver alguma coisa INTENSAMENTE. Se forem dor e sofrimento, que venham, então. Com certeza, os raros momentos felizes serão bem mais coloridos também.



Carina, dia 22/03/2007. 

Humanidade

Faço da caneta uma arma. A única que tenho. Para lutar contra a desilusão, contra o desespero e contra a falta de sonhos.
A falsidade toma conta de tudo. Hipocrizia pura. Me dei conta de que meus ideais não estão também na universidade ou nesta merda de curso que estou fazendo. Decepção total. Minhas utopias ficaram todas para trás. Vou lá para aprender coisas que já sei e também para matar minhas esperanças aos poucos. Transformar o mundo em um lugar melhor vai ficando cada vez mais distante... Morreremos todos sufocados. Pelo aquecimento global. Pelo individualismo. Pela indiferença. Tanto faz.
Falta humanidade. Falta aprender, antes de tudo, a ser gente. falta gostar de gente para ensinar gente a ser mais gente. Falta plantar a semente dos sonhos. Não importa se serão realizáveis ou não, porque a vida vai nos ensinando o que está ao nosso alcance e o que não está. Mas a magia do sonho é o que impulsiona a vida. E os estamos perdendo: em nossas casas, nas escolas e nas universidades. Vamos nos acostumando com a falta de sonhos. Nos acostumando a ver, todos os dias, a morte deles pela tevê. E nos acostumamos também à ideia de que nada podemos fazer para mudar isso.
E assim, secos, vamos levando adiante nossas vidinhas medíocres. Vamos terminando esses cursos que não nos oferecem nada além de um diploma - um mísero pedaço de papel, não não nos dá a nossa humanidade e nem nos devolve nossos sonhos perdidos. Nos tornamos imbecis e nos damos uma auto importância por causa disto.

Carina, dia 31/03/2007.

Melancolia

A chuva de hoje trouxe a melancolia da semana toda consigo... Olhei na janela, vi a chuva que caía silenciosamente e pensei: "Mais um dia triste!". Na verdade, verdade mesmo, sinto que nada acontece, nada de especial, nem mesmo em dias especiais. A diferença é que, em situações assim, outros se conformam, eu não. Não me conformarei nunca!
A realidade é que não encontro mais pessoas que sabem o que eu quero, sem que eu precise pedir. Pessoas que viam em meu olhar o furacão que me assolava. Pessoas que simplesmente sabiam o que eu ia dizer, sem que eu precisasse sequer abrir a boca.

Dia 17/03/2007.

Falta de liberdade é uma condição que impomos a nós mesmos ou nos é imposta? Somos nós quem construímos esses muros altos? Em torno de nós mesmos, que nos limita, impede de irmos além, de ganharmos asas...
Vamos nos tornando aberrações: anjos sem asas, incapazes de chegarmos ao céu, nos debatemos, mas não nos libertamos das correntes que nos aprisionam. Nos deformamos, nos machucamos. Sofremos. Carne dilascerada e sangue derramado em uma luta que não vai dar em nada. De anjos, viramos monstros...



Carina, dia 12/04/2007.

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Borboletas

Hoje nasceram mais algumas borboletas. Todas as que estavam no vidro. Eu já havia visto antes, mas hoje, não sei porque, fiquei mais impressionada. Uma delas nasceu com as asas completamente atrofiadas, incapaz de voar. Fiquei imaginando o por quê, mas não encontrei qualquer explicação viável para isso. Uma das mais belas criações de Deus, que enfeita os céus por onde passa, com suas cores vibrantes, desprovida do direito de experimentar a liberdade... Suas irmãs voaram alto, rumo ao infinito e ela ficou ali, estagnada, agonizante, batendo suas asas como se, a qualquer momento, pudesse acontecer um milagre que fizesse ela alçar voo junto com as outras. Mas não, o milagre não veio, e a morte era a única coisa certa para ela... A única coisa que pude fazer foi colocá-la em um arbusto, como se estivesse, de certa forma, realizando seu último desejo: tocar o verde pelo menos uma única vez. O milagre da vida se desfez. Se desfaz sempre, mas às vezes é muito rápido. Deveria ser assim? Por quê? Não podemos mudar? Nada podemos fazer?

Mas, de repente, me lembrei da Júlia, da Kétlin, do menino novo lá da escola que, além de ser surdo, tem também as perninhas comprometidas, do Rafa, meu Deus, de tantos outros! Que também nasceram - e nascem todos os dias - desprovidos de usufruir plenamente de tantas coisas que a vida oferece. Continuo não conseguindo entender. Superação, será que é isso que eles vem nos mostrar? Será que é a força, o instinto de luta, que faz com que eles consigam ir além, mesmo com tantas limitações? É isso que temos que ver? Ainda assim, não me conformo... Queria que fosse diferente! Queria que eles pudessem ouvir, correr, pular, ver, entender as coisas como nós. Queria que os seus voos pudessem ser os mais altos; suas cores, as mais vibrantes e seus sorrisos, os mais largos...

Assim, na plena consciência dessa impossibilidade, sabendo que não há jeito de ser diferente, vamos levando nossas vidas procurando, a cada dia, mil maneiras diferentes de amenizar a dor que carregamos em nossos corações - pelas crianças e pelas borboletas.

Carina, 01/03/2007.
Durante a primavera, quando morávamos na casa velha, tínhamos uma árvore onde  muitas e muitas lagartas vinham comer de suas folhas, era uma espécie de figueira, acho eu... Eis que a magia se instalava quando elas, finalmente crescidas e fortes, estavam prontas para virarem casulos.
Eu, sempre que podia, colocava-as em vidros para que as crianças pudessem visualizar melhor o processo todo, era lindo demais ver os olhinhos curiosos se iluminando a cada nova transformação. E, quando os casulos se rompiam, nossa, era o encantamento da vida se materializando diante de nós, não tinha explicação... O melhor de tudo era poder ver eles visualizarem coisas que eu passei minha infância toda assistindo na casa da minha avó... Só faltaram os tatus-bola... Mas, enfim, este excerto que fiz serve apenas para explicar porque mencionei o vidro no texto que escrevi... Era apenas uma análise científica feita por seres pequeninos que podem vir a ser cientistas algum dia... Vai saber...
Carina, 19/01/2011.

Só por hoje

Quinta-feira a estação de trem estava escura, estranhamente escura. Poucas luzes acesas. Chuva forte. Era um cenário perfeito para os filmes de terror que tanto gosto. Os rostos das pessoas que partiam e que chegavam pareciam fantasmagóricos... A solidão de cada um evidenciou-se. Cada um a carregar, solenemente, sua pequena dose de solidão, de tristeza, de desamparo...

Minha inspiração aflorou. Incrível como escrevo o tempo todo em meus pensamentos! Mas, depois, muita coisa se perde, acabo não conseguindo transmitir para o papel tudo o que foi soprado em meus pensamentos pela inspiração.

Então, sendo assim, preencher umas poucas linhas tem sido uma constante nos últimos dias, mesmo com todo o turbilhão que se encontra dentro de mim. Me esforço ao máximo, mas resgato apenas um pouco do que me foi oferecido. O resto fica a flutuar em algum lugar aqui dentro, junto com meus anseios e sonhos.


Sempre achamos que não pode chover o tempo todo. Mas chove. Há anos chove em minha alma. Na rua, chove já há mais de uma semana. Nos acostumamos com a chuva. Não devíamos, mas nos acostumamos. Transitamos pelas ruas, fazemos coisas, acostumados também à nossas abstinência de amor. Verdade. Não amamos mais como antes. E nos acostumamos, nos adaptamos, também a essa falta de amor. Não devíamos, mas, sim, nos acostumamos também a isso.

E o mais triste, devo dizer, é que as pessoas não percebem, perderam a capacidade de ver que já não amam mais como antes. A indeferença toma conta. E, assim como nos esquecemos de carregar sombrinha para nos proteger da chuva, também nos esquecemos de nos proteger dessa superficialidade.

Vamos vivendo; vivendo por viver; vivendo porque, às vezes, morrer é muito mais difícil... Um dia após o outro. Como dependentes de uma droga qualquer, pensamos: "só por hoje!" Só por hoje, vou tolerar a intolerância. Só por hoje, vou esquecer a falsidade. Só por hoje, vou conviver com a solidão, inevitável solidão. Só por hoje, não vou lembrar que a morte talvez seja uma saída viável...

Carina, 24/02/2007


Chuva

Há dias chove... Lá fora e aqui dentro. Não me recordo de outro feriado de Carnaval de aparência tão melancólica. Ou será que essa melancolia está em mim mesma? Jamais saberei discernir. Minha tristeza parece vir de todos os lados, cobre tudo, está em toda parte... Mas, estranhamente, a paz mórbida dos domingos tem feito parte dessa tristeza, parte da minha vida. Uma paz de quem não espera grandes mudanças, mesmo com tudo ao redor desabando, transformando-se. Não, aqui dentro nada muda, tudo permanece.
As utopias se foram. A meu ver, o amanhã será igual, exatamente, dolorosamente, igual a hoje e ontem. Sinto, mas o remédio atenua a intensidade do sofrimento. Traz uma apatia, sórdida apatia.
E, ainda assim, quero ficar. Em minhas orações (ou conversas com Deus), digo a Ele que quero cumprir minha missão, ir até o final. Peço a Ele que me deixe ficar, que não me castigue pelas tantas e tantas vezes em que tentei ir... Apesar de tudo, ainda vale a pena viver, mesmo que não tenha cores, mesmo essa vidinha mais ou menos, mesmo que não dê pra fazer a diferença.

Carina, 22/02/2007.

Cinza

Cinzas. Mas o quê, afinal, inflamou para que só restassem cinzas?! O que mais está fulgurando nesta cor tão pálida e sem vida, além do céu?! Penso que talvez seja a minha vida; é, minha vida perdeu a cor. Cubro minhas unhas de vermelho encarnado, numa tantativa desesperada de resgatar um pouco da cor que se foi... Em vão. Tomo o antidepressivo em vão. Me zango, luto contra mim mesma em vão. Me cubro de panos e enfeites em vão... Sei, dolorosamente, sei que nada mais faz diferença.


Carina, 21/02/2007, quarta-feira de Cinzas.

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Para uma menina com uma flor, Vinícius de Moraes

     "Porque você é uma menina com uma flor e tem uma voz que não sai, eu lhe prometo amor eterno, salvo se você bater pino, que aliás você não vai nunca porque você acorda tarde, tem um ar recuado e gosta de brigadeiro: quero dizer, o doce feito com leite condensado. E porque você é uma menina com uma flor e chorou na estação de Roma porque nossas malas seguiram sozinhas para Paris e você ficou morrendo de pena delas partindo assim no meio de todas aquelas malas estrangeiras. E porque você quando sonha que estou passando você para trás, transfere sua d.d.c. para o meu cotidiano, e implica comigo o dia inteiro como se eu tivesse culpa de você ser assim tão subliminar. E porque quando você começou a gostar de mim procurava saber por todos os modos com que camisa esporte eu ia sair para fazer mimetismo de amor, se vestindo parecido. E porque você tem um rosto que está sempre num nicho, mesmo quando põe o cabelo para cima, como uma santa moderna, e anda lento, e fala em trinta e três rotações mas sem ficar chata. E porque você é uma menina com uma flor, eu lhe predigo muitos anos de felicidade, pelo menos até eu ficar velho: mas só quando eu der aquela paradinha marota para olhar para trás, aí você pode se mandar, eu compreendo. 
     E porque você é uma menina com uma flor e tem um andar de pajem medieval; e porque você quando canta nem um mosquito ouve a sua voz, e você desafina lindo e logo conserta, e às vezes acorda no meio da noite e fica cantando feito uma maluca. E porque você tem um ursinho chamado Nounouse e fala mal de mim pra ele, e ele escuta, mas não concorda porque é muito meu chapa, e quando você se sente perdida e sozinha no mundo, você se deita agarrada com ele e chora feito uma boba fazendo bico deste tamanho. E porque você é uma menina que não pisca nunca e seus olhos foram feitos na primeira noite da Criação, e você á capaz de ficar me olhando horas. E porque você é uma menina que tem medo de ver a Cara-na-Vidraça, e quando eu olho você muito tempo você vai ficando nervosa até eu dizer que estou brincando. E porque você é uma menina com uma flor e cativou meu coração e adora purê de batata, eu lhe peço que me sagre seu Constante e Fiel Cavalheiro.
     Sendo você uma menina com uma flor, eu lhe peço também que nunca, mas nunca mais me deixe sozinho, como neste último mês em Paris; fica tudo uma rua silenciosa e escura que não vai dar em lugar nenhum; os móveis ficam parados me olhando com pena; é um vazio tão grande que as outras mulheres nem ousam me amar porque dariam tudo para ter um poeta penando assim por elas, a mão no queixo, a perna cruzada triste e aquele olhar que não vê. E porque você é a única menina com uma flor que eu conheço, eu escrevi uma canção tão bonita para você, Minha namorada, a fim de que, quando eu morrer, você se por acaso não morrer também, fique deitadinha abraçada com Nounouse, cantando sem voz aquele pedaço em que eu digo que você "tem de ser a estrela derradeira, minha amiga e companheira, no infinito de nós dois."
     E já que você é uma menina com uma flor e eu estou vendo você subir agora - tão purinha entre as maria-sem-vergonha - a ladeira que traz ao nosso chalé, aqui nessas montanhas recortadas pela mão presciente de Guignard; e o meu coração, como quando você disse que me amava, põe-se a bater cada vez mais depressa. E porque eu me levanto para recolher você no meu abraço, e o mato à nossa volta faz-se murmuroso e se enche de vaga-lumes enquanto a noite desce com seus segredos, suas mortes, seus espantos - eu sei, ah, eu sei que o amor por você é feito de todos os amores que já tive, e você é a filha dileta de todas as mulheres que eu já amei, como tristes estátuas ao longo da aléia de um jardim noturno, foram passando você de mão em mão, de mão em mão, até mim, cuspindo no seu rosto e enfeitando sua fronte de grinaldas; foram passando você até mim entre cantos, súplicas e vociferações - porque você é linda, porque você é meiga e sobretudo porque você é uma menina com uma flor. "

Vinícuis de Moraes. 

Não sei bem dizer quando foi que conheci Vinícius, pode ser que tenha sido quando eu estava na 8ª série e minha então professora percebeu que eu jamais leria José de Alencar para as aulas dela. Mas, enfim, tive um caso de amor imediato com a poesia dele, cheguei a decorar o Soneto da Fidelidade, aquele que diz "de tudo, ao meu amor serei atento, antes e sempre e tanto, que mesmo em face do maior encanto, dele se encante mais meu pensamento..." (lindo, não?!). Sonhava em ser um dia musa inspiradora de um poeta como ele... Mas, na falta de um, enfim, eu mesma me dediquei este poema, um dos meus favoritos. Leio ele e, como em tantas outras coisas, vejo muito de mim ali... Talvez por nunca ter deixado de ser meio menina mesmo e por acreditar que sempre devemos oferecer flores em vez dos nossos espinhos (todos os temos)... Durmo agarrada no meu bicho de pelúcia até hoje, e não me imagino sendo diferente... Tem coisas pelas quais não valem a pena a gente "crescer"... Disputo meus bichos com minha filha... "Adolescente tardia", como diz minha mãe... Mas, assim mesmo, vou mantendo meu espírito jovem, intacto diante dos anos que vão passando... Menina-mulher, presença-tufão... Menina com uma flor... eternamente...

Carina, 18/01/2011.

Lilith, mais definições...

L I L I T HA Donzela Negra
 

"Ninguém te conhece. Ninguém. Mas eu te canto no seu perfume e na sua graça para a posteridade. E me encanto com a forma como persegues a morte e sua coragem jubilosa..." (Garcia Lorca)


 
"No alto do ramo mais alto, uma tão rosa maçã. Mulher. Esqueceram-na os apanhadores de frutas? Não. Mãos não tiveram para a colher..." (Safo)
 

Não é preciso consenso, nem arte, nem beleza ou idade: a vida é sempre dentro e agora. (Lya Luft)

LILITH
A Donzela Negra
 Por Priscila Manhães
Lilith, é uma variação hebraica (e não judaica) da deusa sumeriana Lil - que significa "tempestade" -, muitas vezes reconhecida como a outra face de Inanna. Seu nome também parece estar relacionado à "coruja", provavelmente pelos seus hábitos: uma sinistra ave de rapina que se precipita, silenciosa, na escuridão, e que, não obstante, também simboliza a sabedoria. Por outro lado, o mito hebreu fala de como Lilith foi moldada de terra e esterco, provavelmente querendo refletir o potencial da terra adubada - o que a relaciona, também, com a SEXUALIDADE e FERTILIDADE.

A história que podemos lembrar de Lilith começa com Innana, a neta da deusa Ninlil, conhecida como "Rainha dos Céus". A história de Innana e Enki nos fala dos costumes sexuais sagrados, que são a dádiva de Innana para a humanidade.

Em seus templos se praticava a prostituição sagrada e suas sacerdotisas eram conhecidas como Nu-gig. Os homens da comunidade buscavam a Deusa nessas sacerdotisas e o ato sexual era sagrado, proporcionando a CURA FÍSICA E ESPIRITUAL. Nessa época,o nome de Lilith era o da Donzela, "mão de Innana", que pegava os homens nas ruas e os trazia ao templo de Erech para os ritos sagrados.

Entre 3000 e 2500 a.c., os sumerianos passaram a ter contatos com culturas patriarcais. Estas, para poderem dominar aquele povo, sabiam que deveriam atacar seu maior centro de poder: o templo do sexo sagrado. Para que a conquista dos sumérios pudesse ter lugar, as culturas patriarcais interessadas começaram a disseminar as idéias de repressão sexual, combatendo como malignas as práticas sexuais milenares dedicadas à Deusa. As práticas sexuais se tornaram então parte da sombra, o poder da mulher foi identificado com o mal e o demoníaco...

Daí, através dos séculos, a Donzela Lilith, que buscava os homens para o Templo de Innana, se tornou no patriarcado o símbolo do mal supremo. Ela encarna de todas as formas e por milênios o medo atávico do homem do poder sexual da mulher.

Mais ou menos em 2400 a.c. Lilith, o Espírito do Ar, foi distorcida como a primeira mulher de Adão, como encontramos em muitos mitos, como um demônio, que foi expulsa do Jardim do Éden. Lillith não é, originalmente, da mitologia cristã ou judaica (e muito menos bíblica - e por isso nem é mencionada nela).

Os hebreus não eram monoteístas como os judeus. Até pelo contrário: eram politeístas. E pautavam sua vida pessoal e comunitária pelos ciclos sazonais - o que os torna também pagãos. Só após a invasão e destruição de Israel pelas forças babilônicas, no século VI a.C., é que começa a surgir o Judaísmo, mais ou menos como hoje o conhecemos - monoteístas e patriarcais.

Os primeiros capítulos da Bíblia (Gênesis 1 a 3) não são os escritos mais antigos desse livro. Sua articulação final data mais ou menos do fim do Exílio na Babilônia e, portanto, traz uma profunda rejeição a tudo que fosse ligado ao "inimigo". A Árvore da Vida, a Serpente e até a própria figura da Mulher são tratadas com menosprezo exatamente para estabelecer uma distinção.

No entanto, é interessante lembrar que o significado do nome "Eva" é "MÃE DE TODOS", e Adão significa "FILHO DA TERRA" - e isso já é suficiente para estabelecer sua antigüidade em relação à própria Bíblia. Certamente trata-se de um mito passado de geração em geração, via oral (como de hábito naqueles povos), que falava de uma GRANDE MÃE e de seu Filho.

Os autores bíblicos inverteram a situação, transformando Adão praticamente num "Grande Pai" e Eva em sua "filha", posto que ela surge a partir dele - evidentemente, para tornar legítima a postura patriarcal que estavam adotando. Da mesma forma, a Árvore e a Serpente - que sempre foram símbolos da Grande Deusa no Oriente - torna-se, na Bíblia, representações do Mal - e é ai que o mito de Lilith pode ser melhor compreendido.

Obviamente, uma transição desse porte não aconteceu sem brigas, discussões e resistência por parte das mulheres. Submetê-las ao patriarcado deve ter sido um trabalho difícil e que demorou várias gerações. As mais resistentes muito provavelmente viram no mito de Lilith toda a sua força ideológica - o que também deve ter causado a reação contrária de transformá-la em um Demônio e mãe de todos os demônios.

Lilith transparece, no mito hebreu, como a mulher livre, sensual, sexual e até certo ponto selvagem. Aquela que não se submete a nenhum homem, mas SEGUE SEUS INSTINTOS E DESEJOS. Por isso ela é representada sobre leões - símbolo da força masculina. No fundo, é a mulher que todo homem deseja mas que também teme, e por isso mesmo, parece um "demônio tentador".

Lilith, na tradição matriarcal, é uma imagem de TUDO O QUE HÁ DE MELHOR NA SEXUALIDADE FEMININA - A NATUREZA DA MULHER, O PODER DO SANGUE MENSTRUAL, que é o poder da Lua Escura. O período normalmente dedicado a Lilith, naquela época, era exatamente o período menstrual. O momento em que as mulheres poderiam ter relações sexuais livres da possibilidade de gravidez e, por isso, tais relações estariam exclusivamente ligadas ao prazer (e não à procriação, como era a perspectiva patriarcal). Assim, muitas vezes, se referiu a essa Deusa como o "Espírito Menstrual".

A reação judaica foi muito rápida e fulminante: transformou em pecado e tabu o sexo no período menstrual - uma artimanha para solapar o culto a Lilith. A segunda foi criar "regras" para a relação sexual - particularmente, regras que garantiam o prazer masculino, mas negava e proibia o prazer feminino. Nesse quadro, Lilith figurava para as mulheres como a experiência sexual capaz de integrar mente e corpo (pois estava livre da gravidez), abrindo um caminho para os tesouros misteriosos do submundo feminino. É encarada como a mulher positiva e rebelde, a que não aceita os padrões patriarcais que marcam a menstruação com dores e vergonha.

Conhecer a figura de Lilith é lembrar de um tempo no passado antigo da humanidade em que as mulheres eram honradas pela INICIAÇÃO SEXUAL, onde expressavam sua LIBERDADE E PAIXÃO NATURAL.

Hoje, depois desses séculos todos de um patriarcalismo opressor, Lilith volta como uma DEUSA NEGRA, ou seja, a energia feminina trancafiada nos calabouços da psiquê de toda a humanidade: para os homens, ela é um desafio; para as mulheres, um arquétipo.

O que significa reivindicar os poderes de Lilith para a mulher de hoje? Na literatura mítica antiga havia 3 Liliths - que refletiam as fases de lua crescente, cheia e escura:
 
A Lilith crescente era Naamah, a Donzela Sedutora
Donzela é a mulher indômita, selvagem, livre, vibrante de energia, imprevisível como o vento. Sua resposta à vida é espontânea, vívida. Totalmente objetiva. Por mais bela que possa ser, não anseia por estabelecer relacionamento, mas para avaliar, experimentar e descobrir suas próprias formas de ordem.

A mulher mais velha pode ter sido limitada ou reprimida na juventude, e pode reivindicar a Donzela, conscientemente, para libertar seu espírito e encontrar a sua direção. Muitas crises de meia-idade são forjadas por uma Donzela enclausurada e confinada, precipitada muito cedo num casamento convencional, sem oportunidade de explorar alternativas na sexualidade ou na carreira.

Mulheres em motocicletas, em laboratórios, estudando as florestas e matas, dançando num palco, discursando na plataforma política - elas são a Donzela.
 
A Lilith Mãe era Nutridora
Na primavera ela abre seu corpo-terra para gerar crescimento novo e brilhante. No verão, ela envolve com braços protetores a terra ardente. Na época da colheita ela espalha amplamente sua generosidade, e, à medida que o frio aumenta, ela aconchega os animais em suas tocas no inverno, puxando as sementes para o profundo interior do seu útero até que volte a época do reverdecimento.

 A Donzela pode inspirar nossos atos criativos, mas a Mãe está presente quando os produzimos.
 
E havia a Lilith Anciã, a Destruidora
Embora a Donzela seja procurada e a Mãe respeitada, a Anciã recebe pouca atenção. Mas é na Anciã que o poder feminino realmente se torna COMPLETO.

A Anciã é SÁBIA, observadora, tecelã, conselheira. Conhece os caminhos entre os mundos. Isso pode fazer dela uma personagem desconfortável, mas é um repositório de sabedoria feminina, do conhecimento acumulado da mulher que não menstrua mais, porém MANTÉM DENTRO DE SI O DEPÓSITO DO SEU PODER.
Na primeira, devemos confrontar as maneiras pelas quais nós somos reprimidos, buscando recuperar nossa dignidade. Na segunda, devemos integrar o desespero que vem de nossa rejeição, angústia, medo, desolação; e na terceira descobrimos o poder da transmutação e da cura dela decorrente, uma vez que ela corta nossas falsas retenções, desilusões e nos ajuda a encontrar nossa essência livre e selvagem.
 

Mulheres Celtas

fogo sagrado MULHERES CELTAS fogo sagrado

As mulheres de origem Celta eram criadas tão livremente quanto os homens. A elas era dado o direito de escolherem seus parceiros e nunca poderiam ser forçadas a uma relação que não queriam. Eram ensinadas a trabalhar para que pudessem garantir seu sustento, bem como eram excelentes amantes, donas de casas e mães.

A primeira lição era:

Ama teu homem e o segue,
mas somente se ambos representarem,
um para o outro o que a Deusa Mãe ensinou:

"Amor, companheirismo e amizade."

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Jamais permita!

Jamais permita que algum homem a escravize:
você nasceu livre para amar,
e não para ser escrava.

Jamais permita que o seu
coração sofra em nome do amor.
Amar é um ato de felicidade, por que sofrer?

Jamais permita que seus olhos
derramem lágrimas por alguém
que nunca fará você sorrir!

Jamais permita que o uso de seu
próprio corpo seja cerceado.
Saiba que o corpo é a moradia do espírito,
por que mantê-lo aprisionado?



Jamais se permita ficar horas
esperando por alguém que nunca virá,
mesmo tendo prometido!

Jamais permita que o seu nome seja
pronunciado em vão por um homem
cujo nome você sequer sabe!

Jamais permita que o seu tempo
seja desperdiçado com alguém que
nunca terá tempo para você!

Jamais permita ouvir gritos em seus ouvidos.
O Amor é o único que pode falar mais alto!

Jamais permita que paixões desenfreadas
transportem você de um mundo
real para outro que nunca existiu!

Jamais permita que os outros sonhos
se misturem aos seus, fazendo-os
virar um grande pesadelo!

Jamais acredite que alguém possa voltar
quando nunca esteve presente!

Jamais permita que seu útero gere
um filho que nunca terá um pai!

Jamais permita viver na dependência de um homem
como se você tivesse nascido inválida!

Jamais se ponha linda e maravilhosa a fim de esperar
por um homem que não tenha olhos para admirá-la!

Jamais permita que seus pés caminhem em direção
a um homem que só vive fugindo de você!

Jamais permita que a dor, a tristeza, a solidão, o ódio,
o ressentimento, o ciúme, o remorso e tudo aquilo que
possa tirar o brilho dos seus olhos, a dominem,
fazendo arrefecer a força que existe dentro de você!

E, sobretudo,
Jamais permita que você mesma perca a
dignidade de ser MULHER!!!



Fonte: Internet, acessado em 18/01/2011.

Quem dera tivéssemos ouvido estes ensinamentos em vez de sermos criadas ouvindo e acreditando em contos de fadas. Que pecado fazemos quando deixamos que nossas filhas acreditem que um dia poderão viver plenamente quando tiverem um companheiro de estrada... Na verdade, somos auto- suficientes, podemos viver nossas vidas sem precisarmos aprisionar nossas almas... O príncipe encantado existe? Podemos, realmente, algum dia, entregar nossa felicidade nas mãos de outra pessoa? Que consigamos pensar nessas questões e, quem sabe, podermos passar estes ensinamentos a nossas netas, para que a magia possa voltar a habitar esse mundinho tão cruel, através delas; enfim, que possamos trazer a este mundo mulheres de conhecimento e poder.

Carina, 18/01/2011.

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Atrite-se!, por Roberto Crema

Ninguém muda ninguém;
ninguém muda sozinho;
nós mudamos nos encontros.

Simples, mas profundo, preciso.
É nos relacionamentos que nos transformamos.

Somos transformados a partir dos encontros,

desde que estejamos abertos e livres para sermos
impactados pela idéia e sentimento do outro.

Você já viu a diferença que há entre as pedras que
estão na nascente de um rio, e as pedras que estão em sua foz?
As pedras na nascente são toscas,
pontiagudas, cheias de arestas.

À medida que elas vão sendo carregadas pelo rio sofrendo
a ação da água e se atritando com as outras pedras,
ao longo de muitos anos, elas vão sendo polidas, desbastadas.

Assim também agem nossos contatos humanos.
Sem eles, a vida seria monótona, árida.
A observação mais importante é constatar que não
existem sentimentos, bons ou ruins,
sem a existência do outro, sem o seu contato.

Passar pela vida sem se permitir
um relacionamento próximo com o outro, é não crescer,

não evoluir, não se transformar.
É começar e terminar a existência
com uma forma tosca, pontiaguda, amorfa.

Quando olho para trás,
vejo que hoje carrego em meu ser
várias marcas de pessoas
extremamente importantes.
Pessoas que, no contato com elas,
me permitiram ir dando forma ao que sou,
eliminando arestas, transformando-me em
alguém melhor, mais suave, mais harmônico,
mais integrado.

Outras, sem dúvidas,
com suas ações e palavras
me criaram novas arestas,
que precisaram ser desbastadas.

Faz parte...
Reveses momentâneos
servem para o crescimento.
A isso chamamos experiência.
Penso que existe algo mais profundo,
ainda nessa análise.
Começamos a jornada da vida
como grandes pedras,
cheia de excessos.

Os seres de grande valor,
percebem que ao final da vida,
foram perdendo todos os excessos
que formavam suas arestas,
se aproximando cada vez mais de sua essência,
e ficando cada vez menores, menores, menores...

Quando finalmente aceitamos
que somos pequenos, ínfimos,
dada a compreensão da existência
e importância do outro, e principalmente da
grandeza de Deus, é que finalmente nos tornamos
grandes em valor.

Já viu o tamanho do diamante polido, lapidado?
Sabemos quanto se tira de excesso para chegar
ao seu âmago.

É lá que está o verdadeiro valor...
Pois, Deus fez a cada um de nós
com um âmago bem forte e muito parecido
com o diamante bruto,
constituído de muitos elementos,
mas essencialmente de amor.
Deus deu a cada um de nós essa capacidade,
a de amar...
Mas temos que aprender como.

Para chegarmos a esse âmago,
temos que nos permitir,
através dos relacionamentos,
ir desbastando todos os excessos
que nos impedem de usá-lo,
de fazê-lo brilhar

Por muito tempo em minha vida acreditei que amar
significava evitar sentimentos ruins.
Não entendia que ferir e ser ferido,
ter e provocar raiva, ignorar e ser ignorado faz parte
da construção do aprendizado do amor.

Não compreendia que se aprende a amar sentindo
todos esses sentimentos contraditórios e...
os superando.
Ora, esse sentimentos simplesmente não ocorrem se
não houver envolvimento...
E envolvimento gera atrito.
Minha palavra final:
ATRITE-SE!
Não existe outra forma de descobrir o amor.
E sem ele a vida não tem significado.

 Roberto Crema-Unipaz

Bom, é isso que sempre acreditei, precisamos das pessoas e das transformações pessoais causadas pelo contato com elas... Não somos os mesmos a cada pessoa que entra em nossas vidas. Sempre nos deixarão marcas, assim como também deixamos nelas... Faz parte, sofremos, nos debatemos, mas sabemos que não há meios de evitar o amor. Ele simplesmente acontece, estejamos preparados ou não. O importante é aprendermos sempre com ele.

Carina. 14/01/2011.

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Poemas e frases, de Florbela Espanca


"Amar!

Eu quero amar, amar perdidamente!
Amar só por amar: Aqui...além...
Mais Este e Aquele, o Outro e toda a gente
Amar!Amar!E não amar ninguém!

Recordar?Esquecer?Indiferente!...
Prender ou desprender?É mal?É bem?
Quem disser que se pode amar alguém
Durante a vida inteira é porque mente!

Há uma Primavera em cada vida:
É preciso cantá-la assim florida,
Pois se Deus nos deu voz, foi pra cantar!

E se um dia hei-de ser pó,cinza e nada
Que seja a minha noite uma alvorada,
Que me saiba perder... pra me encontrar."

"Nunca fui como todos
Nunca tive muitos amigos
Nunca fui favorita
Nunca fui o que meus pais queriam
Nunca tive alguém que amasse
Mas tive somente a mim
A minha absoluta verdade
Meu verdadeiro pensamento
O meu conforto nas horas de sofrimento
não vivo sozinha porque gosto
e sim porque aprendi a ser só..."



"O meu mundo não é como o dos outros, quero demais, exijo demais; há em mim uma sede de infinito, uma angústia constante que eu nem mesma compreendo, pois estou longe de ser uma pessoa; sou antes uma exaltada, com uma alma intensa, violenta, atormentada, uma alma que não se sente bem onde está, que tem saudade… sei lá de quê!"

"Amiga


Deixa-me ser a tua amiga, Amor,
A tua amiga só, já que não queres
Que pelo teu amor seja a melhor,
A mais triste de todas as mulheres.

Que só, de ti, me venha mágoa e dor
O que me importa, a mim?! O que quiseres
É sempre um sonho bom! Seja o que for,
Bendito sejas tu por mo dizeres!

Beija-me as mãos, Amor, devagarinho...
Como se os dois nascessemos irmãos,
Aves cantando, ao sol, no mesmo ninho...

Beija-mas bem!... Que fantasia louca
Guardar assim, fechados, nestas mãos,
Os beijos que sonhei prà minha boca!..."

"Eu ...

Eu sou a que no mundo anda perdida,
Eu sou a que na vida não tem norte,
Sou a irmã do Sonho,e desta sorte
Sou a crucificada ... a dolorida ...

Sombra de névoa tênue e esvaecida,
E que o destino amargo, triste e forte,
Impele brutalmente para a morte!
Alma de luto sempre incompreendida!...

Sou aquela que passa e ninguém vê...
Sou a que chamam triste sem o ser...
Sou a que chora sem saber porquê...

Sou talvez a visão que Alguém sonhou,
Alguém que veio ao mundo pra me ver,
E que nunca na vida me encontrou!"

Florbela Espanca



Costumo ler coisas intensas como eu... Deve ser por isso que os textos técnicos da faculdade, por mais que me interessem, me entediam demais. Tudo o que trago para este blog é o que me identifico, é o que fala à minha alma, ao meu coração. Não poderia faltar Florbela... Eu poderia copiar e colar aqui toda a sua história, sua biografia, mas não... apenas dou a amostra... quem quiser que pesquise, que vá atrás. Separei apenas os poemas que se parecem comigo, com o que trago aqui dentro... Intensos e vívidos como eu... como a fase que estou vivenciando agora. Sim, porque tenho fases, como a lua, como outrora falou Cecília, a Meireles. Me regozijo nela, nessa fase iluminada, pois sei que outros temporais virão, temo-os, mas os sei inevitáveis, então, me fortaleço agora. Fugindo, correndo pro lado oposto e me distraindo com futilidades... Uma estranha, sensível e vazia... O caminho continua... e precisa ser seguido, estejamos prontos ou não para ele...

Carina, 12/01/2011.

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Difícil ser transparente?

 Às vezes, fico me perguntando porque é tão difícil ser transparente?

 Costumamos acreditar que ser transparente é simplesmente ser sincero, não enganar os outros. Mas ser transparente é muito mais do que isso.  É ter coragem de se expor, de ser frágil, de chorar, de falar do que a gente sente...

 Ser transparente é desnudar a alma, é deixar cair as máscaras, baixar as armas, destruir os imensos e grossos muros que nos empenhamos tanto para levantar...

 Ser transparente é permitir que toda a nossa doçura aflore, desabroche, transborde!

 Mas infelizmente, quase sempre, a maioria de nós decide não correr esse risco.

 Preferimos a dureza da razão à leveza que exporia toda a fragilidade humana.

 Preferimos o nó na garganta às lágrimas que brotam do mais profundo de nosso ser...

 Preferimos nos perder numa busca insana por respostas imediatas a simplesmente nos entregar e admitir que não sabemos, que temos medo!  Por mais doloroso que seja ter de construir uma máscara que nos distancia cada vez mais de quem realmente somos, preferimos assim: manter uma imagem que nos dê a sensação de proteção...

 E assim, vamos nos afogando mais e mais em falsas palavras, em falsas atitudes, em falsos sentimentos.

 Não porque sejamos pessoas mentirosas, mas apenas porque nos perdemos de nós mesmos e já não sabemos onde está nossa brandura, nosso amor mais intenso e não-contaminado.
 Com o passar dos anos, um vazio frio e escuro nos faz perceber que já não sabemos dar e nem pedir o que de mais precioso temos a compartilhar: doçura, compaixão...

 A compreensão de que todos nós sofremos, nos sentimos sós, imensamente tristes e choramos baixinho antes de dormir, num silêncio que nos remete a uma saudade desesperada de nós mesmos... daquilo que pulsa e grita dentro de nós, mas que não temos coragem de mostrar àqueles que mais amamos!

 Porque, infelizmente, aprendemos que é melhor revidar, descontar, agredir, acusar, criticar e julgar do que simplesmente dizer: você está me machucando...  pode parar, por favor?

 Porque aprendemos que dizer isso é ser fraco, é ser bobo, é ser menos do que o outro.

 Quando, na verdade, se agíssemos com o coração, poderíamos evitar tanta dor, tanta dor...

 Sugiro que deixemos explodir toda a nossa doçura!  Que consigamos não prender o choro, não conter a gargalhada, não esconder tanto o nosso medo, não desejar parecer tão invencível.

 Que consigamos não tentar controlar tanto, responder tanto, competir tanto que consigamos docemente viver... sentir, amar...  E que você seja não só razão, mas também coração, não só um escudo, mas também sentimento.

 Seja transparente, apesar de todo o risco que isso possa significar.

(Autor desconhecido)

Vou compartilhando com os meus poucos leitores os e-mails que recebo e que penso terem algo relevante a ser olhado, pensado, analisado. Assim como também o faço com relação a meus autores prediletos, retirando excertos de livros que eu li e/ou poemas que falam ao meu coração. Desta forma, vou me desnudando... Muito mais arriscado do que tirar a roupa, literalmente falando. As pessoas que quiserem me conhecer, conhecer a minha alma, basta que olhem com olhos atentos a tudo o que escrevo. São partes de mim, de minha vida, coisas que trago em meu ser/estar no mundo. Bom, acho que sou transparente. Muito mais do que deveria e muito menos do que gostaria. Mas, enfim, quem liga? Dá muito trabalho ler pra conhecer, é muito arriscado olhar dentro do olho. Nos escondemos na superficialidade porque ela afinal nos protege dos acasos da vida, faz com que não sejamos vulneráveis ao amor, coloca pedras nos lugares em que estão nossos corações... Esta sou eu e não me envergonho. A cada texto postado, um pedacinho a mais de mim mesma. De todas as que estão em mim... Quem quiser, que corra o risco!

Carina. 12/01/10.

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Um 2011 do jeito que quiser, por Arnaldo Jabor


O grande barato da vida é olhar para trás e sentir orgulho.
É viver cada momento e construir a felicidade aqui e agora.
Claro que a vida prega peças.
O bolo não cresce, o pneu fura, chove demais, perdemos pessoas que amamos...

Mas, pensa só:
Tem graça viver sem rir de gargalhar, pelo menos uma vez ao dia?
Tem sentido estragar o dia por causa de uma discussão na ida pro trabalho?
Eu quero viver bem...E você?
2010 foi um ano cheio de coisas boas, mas também de problemas e desilusões, tristezas e perdas, reencontros...
Normal...
2011 não vai ser diferente.
Muda o século, o milênio muda, mas o Homem é cheio de imperfeições, a natureza tem sua personalidade que nem sempre é a que a gente deseja, mas, e aí? Fazer o quê? Acabar com seu dia? Com seu bom humor? Com sua esperança?
O que eu desejo pra todos nós é sabedoria.
E que todos nós saibamos transformar tudo em uma boa experiência.

O nosso desejo não se realizou?
Beleza...
Não estava na hora, não deveria ser a melhor coisa para esse momento.

Me lembro sempre de uma frase que ouvi e adoro:
'cuidado com seus sonhos, desejos, eles podem se tornar realidade'.

Chorar de dor, de solidão, de tristeza, faz parte do ser humano...
Mas,se a gente se entender e permitir olhar o outro e o mundo com generosidade,
as coisas ficam diferentes.

Desejo para todo mundo esse olhar especial!
2011 pode ser um ano especial, se nosso olhar for diferente.
Pode ser muito legal, se entendermos nossas fragilidades e egoísmos e dermos a volta nisso.
Somos fracos, mas podemos melhorar.
Somos egoístas, mas podemos entender o outro.
2011 pode ser o máximo, maravilhoso, lindo, especial!
Só depende de cada um...


Arnaldo Jabor

Recebi este texto hoje por e-mail. Veio na hora certa, pois, no fim das contas, o ano começou e eu não tinha conseguido um jeito de dizer uma mensagem de otimismo.
A verdade, nua e crua, é que, ano vem, ano vai, promessas são feitas e refeitas e acabam sendo sempre iguais. Desejamos não sofrermos tanto, não nos endividarmos tanto, não brigarmos tanto com a vida, mas tudo acaba acontecendo exatamente igual, o que muda é o jeito que você encara as situações, se você amadurece ou não com as tristezas, com as decepções, porque estas são inevitáveis.
No ano que nasce as oscilações continuam, a vida segue seu rumo, cheia de altos e baixos, a questão é: você está aprendendo algo novo com o velho? Pensem nisso.
Então, me baseando no texto de Jabor, só posso desejar que todos consigam direcionar novos olhares ao que certamente virá em 2011. E que sejamos fortes!

Carina, 06/01/2011.

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Nexus, Henry Miller

"Eu disse que ela tinha um físico maravilhoso, essa mariposa noturna. É verdade. Era cheia e flexível, sinuosa, macia como uma foca. Quando corro a mão por suas nádegas, esqueço todos os problemas... Mas no instante em que comecei a fazer comparações entre seu corpo e o de Mona, percebi que era inútil prosseguir. Por mais carne e sangue que ela tivesse, não passava de carne e sangue. Nada mais havia nela além do que se podia ver e tocar, ouvir e cheirar. Com Mona, a história era completamente outra. Qualquer porção do seu corpo era capaz de me inflamar. Sua personalidade jazia tanto em sua teta esquerda, a bem dizer, quanto em seu dedo mindinho direito. A carne falava de todas as partes, de todos os ângulos. Estranho, o corpo dela não era perfeito. Mas era melodioso e provocativo. O corpo correspondia a suas disposições de espírito. Ela não tinha necessidade de exibí-lo ou espicaçá-lo, tinha apenas de habitá-lo, de sê-lo.
Havia ainda mais acerca do corpo de Mona: mudava constantemente. Bem me lembro dos dias em que vivíamos com o médico e sua família no Bronx, quando tomávamos sempre juntos um banho de chuveiro, trocávamos carícias, trepávamos o melhor possível - sob o chuveiro -, enquanto as baratas subiam e desciam pelas paredes qual exércitos em debandada. Seu corpo, então, embora eu o amasse, estava fora de forma. A carne pendia-lhe da cintura, em dobras, os seios caíam frouxos, as nádegas eram muito chatas, demasiado infantis. No entanto, aquele mesmo corpo, envolvido num vestido engomado de bolinhas, dava-lhe todo o encanto e fascínio de uma camareira de comédia. O pescoço era cheio, um pescoço colunar, como sempre o chamei, e combinava com a voz rica, escura, vibrante, que dele saía. À medida que corriam os meses e os anos, esse corpo sofria toda espécie de mudanças. Às vezes ficava tenso, esbelto, esticado como um tambor. Quase demasiado tenso, demasiado esbelto. E então ele mudava novamente, cada mudança registrando uma transformação interior de Mona, suas flutuações, seus estados de ânimo, ânsias e frustrações. Mas permanecia sempre provocativo - inteiramente vivo, suscetível, latejante, pulsando de amor, ternura, paixão. A cada dia, ele dava impressão de falar uma nova linguagem.
Que poder, então, poderia exercer sobre mim o corpo de outra mulher? Quando muito, somente um poder débil, transitório. Eu encontrara o corpo, nenhum outro me era necessário. Nenhum outro jamais me satisfaria plenamente. Não, o tipo risonho não me satisfazia. Penetrava-se neste tipo de corpo como uma faca que atravessa o papelão. O que eu almejava era o ilusório. (Esse basilisco ilusório, como eu o definia). Ilusório e insaciável ao mesmo tempo. Um corpo como o de Mona, que, quanto mais se possuía, mais se ficava possuído. Um corpo que trazia em si todas as desgraças do Egito - e seus milagres, suas maravilhas...."

Trecho retirado do livro Nexus, de Henry Miller.

Poético, Henry tem o dom de transformar as coisas carnais em poesia... O jeito que ele fala do corpo de Mona é, talvez, o que toda mulher anseia em seu íntimo, ser muito mais que amada, mas compreendida como uma alma pulsante, um ser que vive e vibra independente de qualquer outro ser. Todas oscilamos, é inerente do ser humano, mais ainda da mulher. A única anotação que fiz quando retirei este trecho do livro é que quem dera eu pudesse causar o mesmo em qualquer homem que amei ou que viesse a amar.... Quem dera....

Carina, 05/01/2011.

Pudim, por Martha Medeiros

Não há nada que me deixe mais frustrada
do que pedir Pudim de sobremesa,
contar os minutos até ele chegar
e aí ver o garçom colocar na minha frente
uma porção minúscula do meu pudim preferido.
Uma só.
Quanto mais sofisticado o restaurante,
menor a porção da sobremesa.
Aí a vontade que dá é de passar numa loja de conveniência,
comprar um pudim bem cremoso
e saborear em casa com direito a repetir quantas
vezes a gente quiser,
sem pensar em calorias, boas maneiras ou moderação.

O PUDIM é só um exemplo do que tem sido nosso cotidiano.
A vida anda cheia de meias porções,
de prazeres meia-boca,
de aventuras pela metade.
A gente sai pra jantar, mas come pouco.

Vai à festa de casamento, mas resiste aos bombons.
Conquista a chamada liberdade sexual,
mas tem que fingir que é difícil
(a imensa maioria das mulheres
continua com pavor de ser rotulada de 'fácil').

Adora tomar um banho demorado,
mas se contém pra não desperdiçar os recursos do planeta.

Quer beijar aquele cara 20 anos mais novo,
mas tem medo de fazer papel ridículo.

Tem vontade de ficar em casa vendo um DVD,
esparramada no sofá,
mas se obriga a ir malhar.
E por aí vai.

Tantos deveres, tanta preocupação em 'acertar',
tanto empenho em passar na vida sem pegar recuperação...

Aí a vida vai ficando sem tempero,
politicamente correta
e existencialmente sem-graça,
enquanto a gente vai ficando melancolicamente
sem tesão...

Às vezes dá vontade de fazer tudo 'errado'.
Deixar de lado a régua,
o compasso,
a bússola,
a balança
e os 10 mandamentos.

Ser ridícula, inadequada, incoerente
e não estar nem aí pro que dizem e o que pensam a nosso respeito..
Recusar prazeres incompletos e meias porções.

Até Santo Agostinho, que foi santo, uma vez se rebelou
e disse uma frase mais ou menos assim:
'Deus, dai-me continência e castidade, mas não agora'....

Nós, que não aspiramos à santidade e estamos aqui de passagem,
podemos (devemos?) desejar
vários pedaços de pudim,
bombons de muitos sabores,
vários beijos bem dados,
a água batendo sem pressa no corpo,
o coração saciado.

Um dia a gente cria juízo.
Um dia.
Não tem que ser agora.

Por isso, garçom, por favor, me traga:
um pudim inteiro
um sofá pra eu ver 10 episódios do 'Law and Order',
uma caixa de trufas bem macias
e o Richard Gere, nu, embrulhado pra presente.
OK?
Não necessariamente nessa ordem.

Depois a gente vê como é que faz pra consertar o estrago . . .



Martha Medeiros.

Penso que nem preciso comentar. É isso mesmo, chega de ser pela metade! Adorooo pudim, e quero um pedaço beeem grande. A gente gasta as calorias adquiridas fazendo muito sexo depois... E, por favor, sexo gostoso, nada de sexo meia-boca!

Carina. 05/01/2011.