Sebos me encantam... Realmente não tenho como passar na frente de um sem parar e entrar, visualizar aquelas estantes abarrotadas de livros e sentir os cheiros de livros velhos... A paz da biblioteca num final de tarde... A paz do domingo de sol preguiçoso... Gosto de sentir os livros, todas as suas histórias, todo o conhecimento do mundo à nossa disposição que, nem que conseguíssemos a façanha incrível de vivermos cem anos, conseguiríamos dar conta de absorver tudo...
Comprar livros em sebos me é um prazer porque sempre fico a imaginar por onde eles andaram antes de irem parar na minha estante, na minha mochila... Há livros que vem com nomes, com assinaturas, com anos... Os últimos que comprei já circulavam por aí antes mesmo de eu nascer... Veja bem quanta magia há nisto! Antes de eu nascer alguém lera o que estou lendo agora... Apago os nomes para cuidadosamente colocar o meu próprio nome nos respectivos lugares e, olhando para as páginas já amareladas penso no legado que deixo aos meus filhos a cada quantia gasta - não, investida - em livros. E quanta, mas quanta história eles carregam... Terão estado em outros países? Será que o antigo dono sentou-se em alguma praça de Paris para lê-lo? Ou no trem de ida para Macchu Picchu... Ou ainda diante dos moinhos da Holanda... Por quantos lugares terão passado estes livros antes de chegarem a mim?
Também se faz necessário dizer que sinto uma pontinha de pesar quando apago estes antigos nomes... Não por seus velhos donos, mas por não podermos fazer isso com certas pessoas também. Porque seria tão simples apagarmos toda uma história com uma simples borracha, seria tão reconfortante guardarmos apenas as lembranças que valem a pena... E, afinal de contas, quais realmente valem e como saber as que não valem? Costumo dizer que o passado nos constitui como pessoa, que nossas histórias são parte do que hoje somos... Mas como certas coisas são doídas de se lembrar... Mesmo sendo parte da gente, tem fantasmas que não nos abandonam nunca mais... E aquela velha cena permanece lá: intocada pelo tempo. Você sente determinados cheiros, escuta determinadas músicas e, num passe de mágica, está lá revivendo, de novo e de novo... Os livros também fazem isto com a gente... E ultimamente tenho sentido vontade de reler o já lido, de rever o já visto, só para ver como estas coisas irão me atravessar agora... Certamente não será da mesma forma que me atravessaram outrora... Sou assim, de tempos em tempos tenho essa necessidade louca de me reinventar... Uma boa leitura pode fazer isso com a gente, mesmo que já seja a segunda, terceira vez que lemos algo, certamente nos transformará de uma forma diferente das outras... porque não somos os mesmos de ontem. E certamente não seremos amanhã os mesmos de hoje. A vida nos transmuta, nos transforma. Então, preste atenção no que vou falar agora: não sou a mesma por quem você em algum momento se encantou, se apaixonou. E é certo que o que trouxe essa paixão, este encantamento, já nem existe mais, nem lá fora e tampouco aqui dentro. Culpa dos livros. E, quer saber? Vou continuar me transformando. E você nem me conhece mais! A graça é exatamente esta: ter de me (re)conquistar todos os dias... Comece lendo livros, assim você se transforma também...