terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Vida e morte


Queria escrever algumas linhas sobre o final do ano... Passamos, enfim, por mais um prenúncio de fim de mundo... ilesos... Mas será que estamos mesmo ilesos? O mundo não acabou - ainda - mas gostaria de dimensionar o quanto estamos ilesos, o quanto estamos a salvo de nós mesmos. 
Vivendo em um planeta em que as pessoas estão cada vez mais egocêntricas, etnocêntricas e arrogantes, pessoas desumanizadas que não conseguem ver além de seus gramados e de seus umbigos... Enquanto a escola se esquiva de fazer seu papel humanizatório, vamos nos perdendo em meio a tanta atrocidade e mediocridade. Estamos vivos? Estamos protagonizando nossas vidas, nossas histórias? O que temos feito para que não passemos por aqui em vão?
Difícil falar sobre estas questões, mas, enquanto a programação da tv nos aliena, enquanto ficam na internet bisbilhotando as vidas alheias e se importando com o que é visto, o que acontece lá fora é a vida... sim, a vida... Independente de você participar dela ou não, ela está lá. Vibrando, colorindo, extravasando, sorrindo... com ou sem você!
E, um dia, como neste último domingo, você se dá conta de que a vida é tão efêmera e frágil... escorre por entre os dedos da gente, feito a areia de uma ampulheta. Você percebe o quanto é importante dizer o que sente, ser sincero - consigo mesmo - e cultivar os amores... Porque pode ser a última vez que você vê aquela pessoa... Pode ser a sua última chance de dizer que a ama, ou que ela o magoou. 
A Morte espreita a todos nós... Com este incidente em Santa Maria, em que morreram mais de 200 jovens, fiquei me perguntando, para quem eu mandaria a primeira mensagem, na eminência de minha morte? De quem eu gostaria de me despedir, de tranquilizar com a minha ida? Fiquei pensando, em meio a minha confusão e tristeza, que talvez - talvez - eu tenha tentado ir embora tantas vezes pelos meus próprios meios por causa da despedida. Para que eu pudesse me despedir de quem amo, dizer adeus, dizer que estaria melhor lá do que aqui... Não queria ser surpreendida por ela. Não queria que ela me levasse em um momento feliz, como fora profetizado outrora... Queria ir com a certeza de que deixei quem eu amo com as palavras certas...
Mas não controlamos isso. Não podemos conversar com a Morte e dizer: "Volte depois, ok? Tenho muito por fazer ainda!" Quantos aquele dia nem puderam despedir-se, talvez porque pensaram que sobreviveriam, talvez pelo simples fato cotidiano de não terem crédito em seus celulares... E, nesses momentos, em que nos sentimos tão pequenos frente ao acaso, é que aprendemos a dar mais valor às pequenas coisas, aos detalhes... Comecei a sorrir à toa lembrando do abraço tão natural do meu filho, vendo minha filha dormir, o amor de meus gatos por mim. Viver não é fácil... concordo... o mundo anda muito complicado, como cantou Renato (Russo) uma vez... Mas morrer também pode não ser um alívio... Principalmente quando deixamos alguém que sentirá por nós... Que saibamos valorizar cada momento, cada minuto junto de quem amamos, que saibamos valorizar a vida, pura e simplesmente, com seus altos e baixos e desafios constantes... Abrace, sorria, beije, quebre regras e seja feliz hoje, agora, porque o presente é a única coisa concreta que temos!




Quero deixar registrado o meu respeito e sentimentos relacionados ao ocorrido... muita coisa já fora escrita a este respeito e esta é apenas mais uma... Mas o último domingo fora o mais estranho de todos... sem nenhuma paz... 


Apenas mais uma de amor



A gente quase completou um ano de namoro, quase. Faltou um mês ou um pouquinho mais, não lembro. Mas hoje, sem mais nem menos, completamos um ano de separação. Ano passado essa hora, exatamente a essa hora, eu lembro bem. Eu estava no show do U2 que você não quis ir comigo e me ocupava em perguntar, de dez em dez segundos, e de dez em dez pessoas, quando é que você iria me ligar e dizer que tinha pensado melhor. Quando? Você nunca ligou, nunquinha. E eu esperei, esperei, esperei tanto tempo, nossa, como eu esperei. Acho que eu nunca esperei tanto nada em toda a minha vida. Outro dia a Myla me perguntou o que você tinha me ensinado. A gente estava conversando sobre os legados que as pessoas deixam em nossas vidas e ela quis saber qual tinha sido o seu. O coiso me ensinou a gostar de MPB e cinema europeu, o outro coiso me ensinou a gostar de sexo e restaurante caro. Teve o coisinho que me ensinou a ser engraçada e jogar frescobol. E você? Que raios me ensinou? Fiquei sem saber na hora, fiquei sem saber o que responder para a Myla. Mas hoje, no nosso aniversário de um ano separados, posso dizer que foi você quem me ensinou a lição mais importante da minha vida: você me ensinou a sofrer. Eu nunca, nunca, em vinte e sete anos de vida, tinha sofrido. Nunca. Claro, eu odiava ver meus pais quebrando o pau quando era criança, mas eu lembro que eu, pequenininha, pensava: um dia um príncipe vai me levar para longe dessa casa com gente louca que fuma demais, berra demais, desmaia e chuta vasos. Eu sofri também na escola, quando para alguém me enxergar eu tinha de promover bizarrices. Mas eu era muito nova para me separar das bizarrices e acabava também chamando a minha atenção: será que eu sou bizarra? Depois, em casa, quando eu dobrava direitinho o uniforme para o dia seguinte e me sentia um papel de parede bege que ninguém entende pra que serve, eu pensava: um dia um príncipe vai me levar pra longe dessa falta de vida, dessa falta de beleza, dessa falta de compreensão, dessa falta de cor, dessa falta de sei lá o que porque eu era novinha demais pra saber o que faltava. Esperar o raio do príncipe sempre disfarçou minha dor, sempre me refugiou dela. Mas quando você, no dia 20 de fevereiro de 2006, me mandou seguir meu caminho sozinha, fiquei sem saber como fugir da dor. Você era meu príncipe. Depois de tantos amores estranhos, pequenos, errados e tortos, finalmente eu tinha reconhecido no seu olhar centralizado e no seu sorriso espalhado, o meu príncipe. E o meu príncipe estava me dando o fora. Que porra eu ia esperar da vida agora? Quem iria me levar para longe se você não me queria mais por perto? Não teve como. Foi a primeira vez na vida que não consegui me enrolar e acabei deixando a dor vencer. Pela primeira vez a realidade falou mais alto que a fantasia. Pela primeira vez a realidade da sua ausência falou mais alto que a fantasia de anos a sua espera. Sofri pra caralho, como diz por aí quem sofre pra caralho. Mais do que livros cabeças, músicas bacanas, frases inteligentes, lugares descolados ou posições sexuais, você me ensinou o que realmente importa aprender nessa vida: que a vida pode ser uma grande, imensa e gigantesca merda. É, ela pode ser. E que não existe porra de príncipe porra nenhuma. Que nem ninguém e nem nada pode te levar para longe de nada. É isso e pronto. E é assim pra todo mundo. E pronto. Qual o drama? A dor infinita dos dias infinitos que vieram depois do dia em que você se foi pra sempre veio misturada com toda a dor que eu não senti em todos esses anos.A dor infinita dos dias infinitos que vieram depois do dia em que você se foi pra sempre veio misturada com toda a dor que eu não senti em todos esses anos. A dor do seu pé na bunda trouxe vasos jogados, bitucas eternas de cigarros em longas discussões pesadas, tardes perdidas em odiar o mundo, cabeças viradas, corredores frios, papéis de parede beges e grupinhos festivos e fechados. A nossa dor acabou sendo toda a dor que fazia fila em mim para ser sentida. E já que a porta pra realidade estava aberta, por que não sofrer também pelas criancinhas carentes, os países em guerra, a estupidez humana e a dor das juntas da minha mãe? Por que não sofrer pela condição das favelas, das prisões e da Terra? Por que não temer o aquecimento global, o ácido dos limpadores de vidro na Henrique Schaumann e as frases do Clodovil? A dor da sua partida trouxe toda a dor do mundo. De uma só vez. Mas agora já passa da meia noite. Não é mais nosso aniversário de fim e, pra te falar a verdade, eu já não sofro mais o nosso fim faz tempo. E pra te falar ainda mais a verdade, eu acho mesmo que você foi o príncipe que eu esperei a vida inteira. Você chegou e me levou embora. Levou embora a menina que tinha medo de sentir a vida e esperava uma salvação para tudo. Quem sobrou é essa desconhecida que se conhece muito bem em suas bizarrices, lê jornais todos os dias, substituiu o bege pela cor do verão, tem uns pais gente boa ainda que malucos, adora os poucos e estranhos amigos, não espera mais pelo cavalo branco mas fica ansiosa pelo início da novela e talvez esteja pronta para amar de verdade. Amar um homem e não um príncipe.