De ti, restou a garrafa com um resto de vinho na geladeira e o pote em cima da mesa. Não vou poder devolver, porque não sei o que houve contigo, se te aconteceu algo sério ou tu sumiu por escolha, como da última vez. Nunca vou saber, porque é isso que acontece quando se vive na clandestinidade e ninguém sabe que a gente existe na vida da pessoa.
Nos primeiros dias, não dormi direito, imaginando toda sorte de coisas que poderiam ter acontecido contigo. Pensei em ligar, só pra ver se com teu alô tu confirmavas que estavas vivo, pedi pra minha mãe te mandar mensagem pra verificar se a ela tu respondias, mas a cada silêncio, aumentava a angústia e a incerteza, me fazendo mal até fisicamente.
O não saber do outro é muito pior que levar um pé na bunda. Muito pior. Porque quando levamos um fora, sabemos que a vida da outra pessoa continuará, mesmo que não estejamos mais nela. Sofremos, mas a vida segue. Já quando as pessoas somem, não sabemos se ainda estão vivas, andando por aí, seguindo sem a gente. E a gente trava, não consegue seguir em frente, porque simplesmente cada lembrança de cada momento é como se fosse uma lança cravada no peito.
Ontem foi pior que antes de ontem. Hoje está pior que ontem. E tenho medo que a cada dia sem saber de ti, eu cada vez mais piore e meu coração morra junto com as parcas fotos e à medida que as lembranças forem se distanciando no tempo. E que, com o passar do tempo, já tendo a certeza de que tu não habitas mais este plano, só tenha um buraco onde meu coração batia... E tu não vai ser a estrela mais brilhante do céu e nem terei ilusões de que estará olhando por mim. Sempre fui secundária e coadjuvante. Sempre o serei.
Ontem minha mãe disse uma frase que ficou ecoando em meus pensamentos: "se já sumiu alguma vez, certamente sumirá de novo." Sim, tu já sumiu. Disse que foi pra me proteger, mas na realidade foi por covardia. Tive a oportunidade de te dizer isso olhando no olho. Da outra vez, esbravejei, te xinguei por email, prometi pra mim mesma que, depois de tanto sofrimento, jamais voltaria a falar contigo.
Mas não, não foi o que aconteceu. Ao teu primeiro sinal de vida, fiquei tão feliz em saber que tu tava vivo que não pestanejei. E tudo cresceu tanto e tão vertiginosamente entre nós, que pra mim, a cada momento em que penso, não sei se prefiro acreditar que tu foi embora outra vez ou se tu morreu. A dor que estou sentindo é a mesma. Sinto tanto, me entrego tanto e ao mesmo tempo não me sinto capaz de fazer quem quer que seja e é justamente por isso que tenho certeza de que, onde quer que tu estejas, estás melhor sem mim. E eu, eu vou ter que levantar - mais uma vez - e (re)aprender a viver. A vida tem que seguir. Vou juntar meus cacos e ir em frente. A vida segue. Sempre segue...