O caso é grave... mais grave do que eu imaginava... Vou fazer uma pequena retrospectiva para contribuir com a reflexão que farei em seguida. Estamos falando de educação, sim, minha gente, educação, essa da qual sabemos que é capaz de transformar a sociedade em que vivemos e o mundo. Só para situar o leitor deste humilde Blog.
Falaremos brevemente dos Parâmetros Curriculares Nacionais e a escolha de seus Temas Transversais. Notem: eu disse brevemente, porque, se tomarmos a discussão real, falaremos por horas sem esgotarmos o assunto.
“A orientação proposta nos PCNs reconhece a importância da participação
construtiva do aluno e, ao mesmo tempo, da intervenção do professor para
a aprendizagem de conteúdos específicos que favoreçam o desenvolvimento
das capacidades necessárias à formação do indivíduo. Ao contrário de
uma concepção de ensino e aprendizagem como um processo que se
desenvolve por etapas, em que a cada uma delas o conhecimento é acabado,
o que se propõe é uma visão de complexidade e da provisoriedade do
conhecimento. De um lado, porque o objeto do conhecimento é complexo de
fato e reduzi-lo seria falsificá-lo; de outro, porque o processo
cognitivo não acontece por justaposição, senão por reorganização do
conhecimento. É também provisório, uma vez que não é possível chegar de
imediato ao conhecimento correto, mas somente por aproximações
sucessivas que permitem sua reconstrução.” (Introdução aos PCNs, 1997,
p.44)
Este pequeno trecho da minha rápida pesquisa aponta que o aluno é o principal sujeito de sua aprendizagem, deve reconhecer-se como sujeito histórico e atuante ativo na construção desta história. Ou seja, visa a visão completa e holística do ser humano e de sua formação como tal. Então, a educação, ou o processo de ensino e aprendizagem deve contemplar isso. Deve formar um cidadão.
Os Temas Transversais visam complementar a formação do aluno, saindo da visão conteudista e tendo por objetivo um "ensinar a pensar", o transformar do aluno em pesquisador, curioso e crítico, capaz de agir positivamente frente às dificuldades e desafios que encontrarem.
"Segundo o documento de Apresentação dos TTs, eles são “questões
sociais consideradas relevantes”, “problemáticas sociais atuais e
urgentes, consideradas de abrangência nacional e até mesmo de caráter
universal” (1997, p.64). Segundo tais critérios foram selecionados:
1. Ética
2. Meio Ambiente
3. Saúde
4. Pluralidade Cultural
5. Orientação Sexual.
Há
a esperança, por parte dos idealizadores, que os TTs sejam debatidos no
interior das disciplinas. O tratamento denominado transversal
garantiria que os temas não fossem contemplados por apenas uma área do
conhecimento, ou que constituíssem novas áreas. Todas as áreas
consideradas “convencionais” são responsabilizadas pelo acolhimento das
questões dos TTs. Os conteúdos e objetivos das disciplinas devem visar
aos temas considerados “da convivência social”. Deste modo, é muito
salientado no documento de Apresentação dos TTs que estes devem ocupar o
mesmo lugar de importância que as áreas dos PCNs."
Na realidade, quero chamar a atenção para a problemática que temos em mãos a partir da compreensão destas questões. Os TTs não foram aplicados, sequer discutidos no interior das instituições de ensino para viabilizar o que se propunha a fazer: formar seres humanos pensantes. Dentro desta premissa, hoje temos o Ensino Politécnico, que veio de certa forma impor que esta questão voltasse a ser pensada dentro das escolas. Sim, impor. Porque a simples proposta dos PCNs não foi suficiente para que as coisas acontecessem.
Penso que só assim para que os processos tenham andamento dentro das escolas. Outrora fiz uma crítica à descaracterização do EJA, para onde estão sendo encaminhados os alunos que "não deram certo no ensino regular", falta motivação, falta entusiasmo, mas e não é geral isso? Educadores também se engessam por conta de seus ditos salários baixos, também não se dão o trabalho de repensarem suas práticas porque "não ganham para isso". E agora estão se batendo, digo literalmente se batendo por conta de uma ordem que não conseguiram entender e consequentemente atender e que era tão, mas tão óbvia.
O tal do Politécnico nada mais é do que a imposição que se trabalhem os TTs dentro das salas de aula. Simples. E complicado ao mesmo tempo. Complicado porque qualquer coisa que me desacomode e que me faça (re)pensar sobre a minha prática jamais será bem vinda.
Toda essa discussão vem ao encontro do que outrora já fora apontado com a inclusão, afinal, tentar outras metodologias, fazer e refazer as práticas e planejamentos eram parte da proposta inclusiva. Enxergar o aluno como sujeito único e com necessidades e especificidades próprios. Essencial e óbvio e talvez por isso tão difícil de se colocar em prática.
Mas o que temos hoje em detrimento de toda esta questão é que as escolas seguem com suas práticas equivocadas por conta do engessamento. O que engessa o professor muitas vezes é a crítica excessiva ao alunado e também, como não poderia deixar de ser, a boa e velha desculpa do baixo salário e falta de valorização. Criaram uma nova disciplina, o "Seminário Integrado", que de integrado mesmo só tem o nome, porque na verdade segue fragmentando as áreas de conhecimento que, em vez de caminharem juntas, ainda partilham de opiniões diferenciadas no que diz respeito ao tal do projeto. O tema "Saúde" está separado das áreas de conhecimento quando tinha que estar junto, sendo pensado dentro de cada disciplina e por cada educador. O que virá depois?
Transversalidade, interdisciplinaridade, meu povo, nada mais é do que manter um diálogo franco e aberto entre os diferentes componentes curriculares, o que por certo levaria a uma formação total do aluno, contribuindo de forma efetiva na formação de seu caráter e identidade cidadã, responsável e digna.
Por que é tão difícil assim? Porque não queremos dar este olhar diferenciado, porque é muito mais fácil eu olhar e apontar os problemas no outro do que tentar corrigí-los em mim mesmo.
Somente no momento em que os educadores e trabalhadores em educação se abrirem para a formação continuada, somente no momento em que souberem dar um olhar crítico às próprias práticas é que conseguirão prosseguir com projetos grandiosos que colocam em xeque a pergunta que não quer calar - e nem deve: "com que tipo de cidadão quero conviver em sociedade num futuro não tão distante?"
-> Contextualizando o leitor: estamos na primeira semana de férias do alunado nas escolas, período geralmente utilizado para formação continuada dos professores, chamada "Jornada Pedagógica", onde são ministradas palestras e pequenas oficinas para que possibilite uma reciclagem aos educadores. Tamanha foi minha surpresa hoje quando vi/ouvi de um dos ministrantes que a politecnia nada mais é do que trabalhar a transversalidade dentro do currículo previsto. Isso é óbvio demais, uma vez que está há anos previsto nos Parâmetros Curriculares Nacionais. Choquei! E a segunda palestra foi sobre a avaliação dentro deste "novo" contexto. Deve ser qualitativa e não quantitativa. Mais uma coisa óbvia. Deve observar os processos e não um resultado final. Afinal, se temos claros nossos objetivos e metas dentro de cada conteúdo trabalhado, sabemos também se o aluno alcançou ou não estes objetivos e o que devemos mudar para que venha alcançar. Ou seja, possibilita uma avaliação do processo do aluno e de nossa própria metodologia. Possibilita-nos oportunidades únicas de mudanças. Mas a dificuldade de fato está em revermos nossas práticas e é exatamente por isso que ainda estamos arraigados no sistema quantitativo excludente. Nossa... tão óbvio que chega a ser vergonhoso ver que alguns colegas simplesmente não conseguem se desfazer de suas práticas equivocadas. Então, me vi na obrigação deste esclarecimento. A quem interessar possa. Pois enquanto ainda tivermos pessoas desvalorizando estes momentos de reflexão, com conversas paralelas, fones de ouvido - os mesmos fones que criticam nos alunos - ridicularizando o trabalho de uma Supervisão comprometida e séria, que tenta viabilizar a instrumentação para melhoria das práticas, enquanto ainda tivermos esta total falta de comprometimento por parte de muitos educadores, seguiremos lutando por uma valorização da classe que nós mesmos não somos capazes de nos inferir... Pensem nisso, porque o movimento de mudança começa por nós mesmos...