terça-feira, 31 de dezembro de 2013

Um novo ano requer novas pessoas!

E amanhece o último dia de 2013... No ano passado, neste mesmo dia, estava organizando as coisas na casa nova, tinha recém me mudado e haviam milhares de novos caminhos a serem trilhados. A liberdade, a novidade e as infinitas possibilidades... 
Há muita poesia e muito significado em dias como estes, porque são dias em que podemos sentir a magia no ar, essa magia que nos cerca, que está em toda a parte, mas que, em outros dias, dias normais, se esconde, fica subentendida e somente aqueles que são mais sensíveis conseguem percebê-la.
Paro para refletir sobre o ano que está indo embora e posso concluir que 2013 foi um ano bom, apesar de alguns períodos de baixos... Mas, enfim, a vida é feita de momentos tristes e felizes, não existe felicidade absoluta e penso que os momentos tristes são para que possamos crescer e aprender com eles. 
Em 2013, me libertei de grilhões que me aprisionavam, os últimos em meu processo, ser livre, aprender a ser livre, não foi fácil, precisei amadurecer e me virar sozinha. Mais do que antes. Pessoas passaram a fazer parte de minha vida de forma mais significativa, outras saíram dela sem sequer deixar marcas, sofri, chorei, mas fui vencendo as dificuldades e me tornando mais forte.
Os momentos felizes, foram muitos também, momentos em que estive com aqueles que amo e que sei que me amam também, filmes, cinema, festas, jantares, almoços, passeios...
Os desafios profissionais, a escola, a Ulbra, passei em uma seleção que, depois tive a dimensão da importância dela, única tradutora da Ulbra que não esteve no curso... Na escola, o ano foi de inúmeros aprendizados. Eu e meus alunos aprendemos que não podemos mudar algumas coisas, que devemos ser pacientes e esperar. Fizemos muitas coisas legais, mas nos decepcionamos em outros tantos momentos. As lágrimas deles e frustrações foram minhas também, não pudemos subverter o sistema, mas, ao menos, não nos rendemos a ele. 
Em casa, a união com meus filhos se fortaleceu, na base da briga, da discussão, dos enfrentamentos, mas também de muitos momentos de descontração, risos e abraços. O amor prevaleceu. Apesar da minha ausência constante, ambos venceram suas batalhas pessoais, provando que são pequenos guerreiros, me deram tanto orgulho.
Em resumo, 2013 foi um ano de grandes mudanças e desafios. Como todos os outros foram até hoje. Mas, a grande e real mudança deve vir de dentro, deve estar dentro de nós.
Guardo inúmeras, infinitas expectativas do ano que está por vir, mesmo sabendo que expectativas não são assim tão boas, mas, enfim, somos humanos e queremos sempre mais. Mas tenho a plena consciência de que muitas coisas dependerão única e exclusivamente de mim mesma. Inclusive minha felicidade. 
Então, que 2014 seja um ano iluminado, que sigamos trilhando no caminho do bem, mesmo quando pensarmos que o mal está mais forte, que ele não prevaleça. Que tenhamos coragem de fazer novos amigos e acreditarmos nos seres humanos, mesmo conhecendo e sabendo desta nossa odiosa natureza humana. Que saibamos plantar coisas boas, mesmo que o terreno nos pareça infértil, mesmo que a terra pareça dura, porque tudo o que plantarmos, certamente colheremos mais tarde. E, por favor, que nesta colheita saibamos que colhemos apenas e somente aquilo que plantamos, não podemos esperar por algo que não semeamos. Que saibamos cultivar as velhas amizades, para que permaneçam conosco pelos próximos anos que virão. Que tenhamos força para amar, mesmo quando não formos correspondidos. Que nossas quedas nos ensinem a levantar mais fortes. Que tenhamos esperança de dias melhores nos momentos de desespero. Que saibamos conviver conosco nos momentos de solidão, pois somos a única companhia que teremos no final de tudo. Que façamos mais leituras, que cultivemos mais o nosso cérebro, porque ele será a única coisa que nos restará quando não tivermos mais a nossa juventude. Que tenhamos perseverança para continuar estudando, pesquisando, que sejamos curiosos, que tenhamos a capacidade de fazer mais perguntas do que de dar respostas. Que estejamos abertos para as mudanças, mas que elas não nos façam perder a nossa essência. Que sejamos livres, leves e que tenhamos fé, seja no que for, para que saibamos nos responsabilizar por nossas escolhas, mesmo quando não forem as escolhas certas. Que, em meio a tanto caos, sejamos capazes de ver o que a vida tem de bom, que possamos nos regozijar em meio a natureza, sempre agradecendo a Grande Mãe pelo maior presente que nos deu: a possibilidade de partilharmos destas maravilhas com nossos irmãos. 
"Tudo o que não me mata, me fortalece." - disse Nietzsche e penso que talvez esta seja a frase que mais resume a nossa existência neste planeta insano. Então, que esta consciência prevaleça em nós quando pensarmos que tudo está perdido. 2014 é só mais um ano. Não será fácil, porque viver não é fácil, mas depende de nós tornarmos ele mais leve, mais cheio de amor e de harmonia... 
Que venha 2014! Estou pronta! E vou me levantar mais forte cada vez que cair e valorizar mais e mais os momentos felizes e aqueles que estão ao meu lado partilhando de todos eles!
Que este seja um ano de evolução e de colheita! 

sábado, 5 de outubro de 2013

Ele era simplesmente aquele que suportava calado e de olhos fechados quando eu me ausentava de mim mesma. Sou assim, me afasto quando estou triste. Penso que as pessoas não tem de suportar caras amarradas e lágrimas alheias. A vida já é difícil para cada um de nós sem isso. Mas ele, ele ficava lá. Sem dizer uma só palavra.
Quando todos os outros desistem, ele me agarra pela mão e não deixa que meus temporais me carreguem. Aparece em sonhos e com apenas um olhar ressignifica tudo ao meu redor. A impossibilidade de tê-lo por perto faz com que o vazio aumente e cada vez mais e mais me sinto desconectada e distante deste mundo.
Sou eu que estou errada? Quando me afasto e me calo em minha dor... Quando, ferida e quase morta pela pancada, junto o que me resta de forças para isolar-me deste mundo tão cruel? Ele não me julga. Nunca me julgou. Mas sempre fica por perto, mesmo quando eu o mando embora. Abraça-me e sorri, sabe que não é a ele que quero agredir. Entende que é apenas o meu jeito de pedir socorro. 
Tento respirar fundo antes de me jogar no abismo. A queda é inevitável. Mas evito afogar-me em minhas próprias lágrimas. Porque segunda-feira está aí e já tenho que acordar cedo e fazer tudo aquilo que me afasta mais ainda de mim mesma. E sorrir e falar coisas sem sentido para conviver com pessoas que nada me acrescentam. Minha casa, meu castelo, meu porto seguro, volto dos espólios da guerra. Cada novo dia uma nova batalha travada. Contra os outros e contra mim mesma. E ele me espera. Hoje percebi que ele não me traz segurança, ele me traz paz. Só isso. A paz que eu preciso para ir adiante. A paz que eu preciso para manter desperta a minha essência.
Muitas vezes respirar fundo não é o suficiente. A dor sufoca. Aperta a garganta. Engulo a saliva e sinto gosto de sangue. Parece que tudo ao meu redor está partido, fragmentado. Falsos amores, falsos amigos, falsa compreensão do que sinto, de como sinto. As pessoas sorriem e em nada consolam. É como se eu flutuasse em um mundo à parte. Aprendi desde cedo que os bons são os que mais perdem. Lógica inversa e perversa. Mas jamais pensei que seria tão difícil conviver com isso. Jamais! Ele aqui, tão perto de mim, tão longe de mim, me lembra que nem sempre foi assim. Mas o mal finalmente venceu. E quem é bom precisa viver à espreita, escondido, como se fosse um crime ser benevolente. Não quero lembrar e não consigo esquecer. 
Deito-me em minha cama, embaixo de cobertas bagunçadas e, como se estivesse em uma concha, protegida de tudo, adormeço, para, quem sabe, encontrá-lo no mundo dos sonhos. Sei que ele está ali, esperando por mim, para acalentar minha tristeza e falar com o olhar que tudo ficará bem, tudo vai dar certo.
A distância ainda me atormenta porque não sei esperar. Queria que me pegasse no colo porque não sei lidar bem com estes tantos eus em mim. Eu só queria ficar bem. Queria sentir, nem que fosse só por um dia, que faço parte deste mundo. Mas ele sorri e me diz, sem dizer nada, que eu não pertenço mesmo a este lugar. Que meu mundo está esperando meu retorno, mas que isso não vai ser no meu tempo, mas no tempo deles. Por que nos separaram? Por que quiseram que eu e não ele viesse para este lugar? Eu sei a resposta. Mas não quero aceitar.
Não sei ser filha, não sei ser mãe e não sei ser irmã. Não sei nem se sei ser gente. Os animais sempre tocaram mais a minha alma. Quando estou com eles sei que posso ser eu mesma. Discurso velho, esse. É porque é difícil agradar as pessoas. Algumas vezes quero abraçar, mas sinto que não querem o meu abraço, outras, como ontem, com meu filho, sinto que querem o meu abraço, mas sou eu que não quero abraçar. Fazer o que se quer, neste sentido, pode - e certamente vai - ser mal interpretado. Julgam-nos egoístas quando fazemos o que queremos. Mas ele não. Ele somente fica. Mesmo quando todos foram embora. Eu tenho pressa e ele me acalma. Eu quero agora e ele ensina a aceitar o depois. Eu quero partir e ele pede pra ficar um pouco mais. Quando penso que perdi minhas forças, ele me mostra que ainda posso prosseguir. 
E assim vou vivendo. Distante sem querer. Partida em mil pedaços, mas sempre inteira aos olhos dos outros, Apenas mais uma alma atormentada em meio a tantas almas atormentadas. O inferno é aqui, alguém disse algum dia. Eu concordo. Não pode ser pior do que isso. Nada pode ser pior do que isso. Mas eu tenho meus refúgios. Vou voltar para a cama, meus gatos me esperam. Ele me espera. Porque desde sempre é só o que ele tem feito. 

terça-feira, 9 de julho de 2013

Entre erros e acertos: por um professorado mais ético!





Comprometimento: 1. Ação de arcar com um compromisso feito a alguém, se utilizando de regras propostas a fim de se alcançar a exatidão do ato ou ação. 2. Qualidade de ater-se às escolhas feitas. Começo este texto com a palavra de ordem do momento: comprometimento. Ainda segundo o dicionário, alguns de seus sinônimos são: envolvimento, compromisso, responsabilização. Conheço bem estas palavras. Mas, ao voltar de um congresso de educadores, tudo o que fiz foi lamentar ao perceber que a maioria de meus colegas desconhece tais significados. O que venho fazer aqui nesta postagem hoje, amigos, é muito mais do que lamentar, é, também, denunciar.

Participei no penúltimo final de semana de um congresso voltado a professores e funcionários do Estado que são sindicalizados (coisa que sou desde o primeiro ano em que entrei no exercício de minhas funções), com o objetivo de deliberar algumas resoluções sindicais que são de extrema importância aos interessados. Algumas das coisas discutidas tem profunda relação com a sala de aula, com o pleno exercício de nossas funções na escola, como o processo de inclusão e o ensino médio politécnico. Mas, entre outras coisas, também foram discutidas e, vejam bem, votadas, escolhidas, outras resoluções de suma importância, tais como projetos de meio ambiente e sustentabilidade, aposentadoria e contratação emergencial e um possível rompimento do sindicato que nos representa com a CUT (Central Única dos Trabalhadores), este último, com certeza, um divisor de águas histórico para a categoria. O encontro fora dividido em dois momentos: no sábado, todos foram divididos em grupos para votarem e discutirem as resoluções que entrariam na discussão e votação do grande grupo. No domingo, tudo que fora escolhido no dia anterior entrou em votação e deliberação de TODOS. 

O que tenho para dizer aqui me é penoso e vergonhoso, mas tem de ser dito. Todas as pessoas que são sindicalizadas sabem a importância que tem o sindicato nas muitas lutas e conquistas dos trabalhadores. Há uma contribuição mensal que é descontada em folha que paga as custas do sindicato. Portanto, àqueles que tem a falsa crença de que a viagem e tudo o mais fora de graça, tenho uma notícia para dar: saiu do meu, do teu, do bolso de todos que contribuem e que, por um "acaso", não puderam estar presentes no evento. Pois bem. Toda a viagem, incluindo despesas com hotel, comida e tudo o mais foi bancada pelo sindicato, visando a importância do momento para a categoria. Mas, como eu disse anteriormente, fomos todos nós que pagamos, portanto, a representatividade nas votações era o mínimo esperado por todos aqueles que também ´pagam o sindicato e que por ventura não puderam estar lá. O que tenho para dizer é lamentável. Uma parcela bem grande, inclusive do grupo do qual fiz parte, do 14º Núcleo do CPERS, foi pelo turismo. Isso mesmo. Até mesmo porque tem a falsa crença de que era "boca livre", esquecendo de que sai do bolso de todos, até mesmo deles próprios. 

No sábado, quando as resoluções foram votadas nos grupos menores, tinham algumas "delegações" vendendo pacotes de turismo, para fazer compras em Farroupilha. Por vinte reais, uma van pegava você em frente ao local do evento e você poderia passar a tarde no shopping, enquanto os colegas comprometidos ficaram lá por mais de 3 horas votando em temáticas que são importantes - como eu já mencionei acima - a todos. Este foi o primeiro absurdo de muitos outros que ainda estavam por vir. Já sabemos que uma boa parcela dos escolhidos a participarem do evento optou pelo turismo, mas ainda temos uma outra parcela. A parcela dos que ficaram dormindo nos ônibus enquanto o evento ocorria. Sim, isso mesmo que vocês acabaram de ler. Pessoas que ficaram não só na tarde de sábado, por talvez terem considerado que a tarde de domingo seria mais importante, mas que também passaram a tarde de domingo inteira, passeando no local do evento ou dormindo dentro dos ônibus. Lógico que esta denúncia é importante e tenho plena consciência de que, a partir dela, muita gente poderá "ficar de mal" (notem que sequer menciono o risco de perder o emprego) - porque o chapéu certamente irá servir. Mas sinceramente, não me importo. Ando cansada dos abusos e absurdos que tenho visto. E, como disse outrora, tenho a palavra como principal arma na luta contra a injustiça. E seguirei lutando, uma vez que, como dizem, vivemos num país democrático.

Isto não é tudo, gente. depois de ter participado ativamente em todos os momentos do evento ( domingo foram mais de sete horas sentada votando e ouvindo defesas das resoluções), de ter valorizado o meu dinheiro e os dos milhares de colegas que também contribuem e que não se fizeram presentes no evento, ainda tem mais, muito mais, a ser dito. Preparem-se, não será agradável.

Não sei contabilizar quantas pessoas tinham no evento, mas possivelmente passaram das três mil. Como já disse antes, era voltado para professores e funcionários de escola, mas, com certeza, a maior parte era composta por educadores, com formações das mais diferentes áreas, mas que atuam ou atuaram como professores em escolas do Estado, oriundos das mais distintas regiões do Rio Grande do Sul. Os serviços de restaurante e de limpeza foram contratados pelo CPERS para atuarem no local e, com certeza, não há reclamações de tais serviços prestados. A comida era sempre de primeira e nunca faltou a quem quer que seja. Os hotéis, por sua simplicidade, em algumas cidades, talvez tenham deixado a desejar. Mas eu, pessoalmente, não tenho do que reclamar. Já fiquei em lugares muito piores. E não sou e nem nunca fui rica para exigir mais do que isso. 

Então, caros colegas, exatamente por ser um congresso de professores, algumas coisas que vi e ouvi por lá me foram pesarosas por demais. Decepção com a classe e com a profissão. Triste, triste, triste. Os relatos começam desde a primeira noite, onde, na fila para o jantar, muitos - muitos mesmo - furaram fila, aderindo ao bom e velho "jeitinho brasileiro". Ridículo. As filas que se formavam a cada refeição eram enormes, considerando-se o número de pessoas que tinham, mas, como comentei antes, não faltou comida a quem quer que seja. Pessoas invadindo lugares, correndo para o buffet, como se fosse o último momento em que comeriam algo em suas vidas. Algo que costumamos ver talvez em shows de grande porte, com adolescentes, mas que nunca em minha vida pensei que veria acontecer com pessoas maduras e com certa caminhada na área da educação. 

Nos banheiros, haviam placas improvisadas pela organização que solicitavam que não se jogasse erva de chimarrão nas pias. Isso mesmo. Difícil de acreditar, mas, as pessoas fizeram este tipo de coisa, sempre com aquela ideia de que as pessoas que estavam lá trabalhando estavam lá para "servir". Assim que tratam os funcionários em suas escolas. Assim que agem o tempo todo, destratando lojistas, motoristas, atendentes, pessoas honestas que estão também - ora vejam só - ganhando seu sustento, através de um trabalho minimamente digno. Como disse em uma outra postagem, os nossos diplomas compram arrogância e prepotência. Junto com eles, vem a falsa ideia de que somos mais do que outros e que nossos saberes são mais importantes do que os dos demais. As meninas que estavam trabalhando na limpeza e manutenção dos banheiros, meus deuses, estavam assustadas. E com razão. Era animalesco. Até seria ofensa dizê-lo porque até meus gatos limpam a sujeira que fazem. Professoras que se achavam no direito de colocar papel toalha no chão, como se fosse um chiqueiro. E papel toalha de ótima qualidade, diga-se da passagem. Deu-me pena. Um gasto exacerbado com coisas que poderiam ser poupadas, que poderiam ter sido gastas em outras coisas. Mas, imperou a falsa ideia de que "era de graça mesmo, então vamos gastar." Falta de consciência, falta de educação, falta de humanidade. 

Vindo de outras pessoas, talvez, pudéssemos usar daquela velha desculpa de que não tiveram educação. Mas, minha gente, estamos falando de pessoas diplomadas. Pessoas que, a meu ver, não devem ter comprado seus diplomas... Ou será que compraram? Por estas e outras coisas que insisto em dizer que formação não gera caráter. Diploma não compra sensibilidade. Curso nenhum no mundo humaniza. Isso está ou não está em nós. Simples assim. Ou não tão simples... A questão é que é chocante e lamentável. Somos pessoas que trabalham com seres humanos, mas percebo que muitos de nós sequer são humanos. Como humanizarmos, como exigirmos algo de nossos alunos que nós mesmos não somos capazes de fazer? Eis a questão... E essa pergunta não vai calar. 

Queremos unidade numa classe que não tem caráter. Onde, dentro das escolas, passamos levando rasteiras de colegas que eram para ser parceiros. Além de todas as preocupações que temos, temos de tentar nos livrar das garras de pessoas que não tem ética e nem moral para estarem dentro das escolas. Mas estão lá, com seus empregos garantidos por uma gestão que protege e esconde arbitrariedades. Vítimas de nós mesmos. Não tem como ser classista numa raça como esta. Não tem mesmo. As pessoas reclamam dos advogados, mas insisto em dizer que o professor ainda é a pior classe que existe. E deveria ser a melhor. Insistimos em dizer que somos desvalorizados, que nossos salários são baixos, mas estamos sempre dando um jeito para não cumprir nossa carga horária. Sempre escamoteando, escondendo, jogando. O que é isso, minha gente? Até quando? Chega de hipocrisia! Chega de proselitismo! 

Estou decepcionada. Nunca sonhei em ser professora, mas, a partir do momento que me tornei uma, fiz jus a cada minuto em que cumpri este papel. Perdoem-me os hipócritas e medíocres. Mas não me contento em ser mediana. Se não for para fazer a diferença, mínima que seja, na vida do meu aluno, eu nem trabalharia. Me esconderia atrás de um balcão qualquer e me incomodaria bem menos. Mas sigo lutando porque tenho ideais. Parem de reclamar e arregacem suas mangas. Façam por merecer o cargo que ocupam. Participem, opinem, sejam críticos e, principalmente, tornem seus alunos críticos também. Vale a pena. Caso contrário, pendurem suas chuteiras, mudem de área, aposentem-se. O mundo já tem gente desonesta e déspota o suficiente. Não precisamos que este tipo de gente esteja nas escolas. Vocês estão na área errada se acreditam que ficarão mais ricos tirando vantagem. Aqui todo mundo segue ganhando igual e, vou dizer uma coisa para vocês, tem gente que nem merecia o parco salário que recebe. Eu faço minha parte, e você?

"Manhê! Tirei um dez na prova
Me dei bem tirei um cem e eu quero ver quem me reprova
Decorei toda lição
Não errei nenhuma questão
Não aprendi nada de bom
Mas tirei dez (boa filhão!)
Quase tudo que aprendi, amanhã eu já esqueci
Decorei, copiei, memorizei, mas não entendi
Quase tudo que aprendi, amanhã eu já esqueci
Decorei, copiei, memorizei, mas não entendi
Decoreba: esse é o método de ensino
Eles me tratam como ameba e assim eu não raciocino
Não aprendo as causas e conseqüências só decoro os fatos
Desse jeito até história fica chato
Mas os velhos me disseram que o "porque" é o segredo
Então quando eu num entendo nada, eu levanto o dedo
Porque eu quero usar a mente pra ficar inteligente
Eu sei que ainda não sou gente grande, mas eu já sou gente
E sei que o estudo é uma coisa boa
O problema é que sem motivação a gente enjoa
O sistema bota um monte de abobrinha no programa
Mas pra aprender a ser um ingonorante (...)
Ah, um ignorante, por mim eu nem saía da minha cama (Ah, deixa eu dormir)
Eu gosto dos professores e eu preciso de um mestre
Mas eu prefiro que eles me ensinem alguma coisa que preste
- O que é corrupção? Pra que serve um deputado?
Não me diga que o Brasil foi descoberto por acaso!
Ou que a minhoca é hermafrodita
Ou sobre a tênia solitária.
Não me faça decorar as capitanias hereditárias!! (...)
Vamos fugir dessa jaula!
"Hoje eu tô feliz" (matou o presidente?)
Não. A aula
Matei a aula porque num dava
Eu não agüentava mais
E fui escutar o Pensador escondido dos meus pais
Mas se eles fossem da minha idade eles entenderiam
(Esse num é o valor que um aluno merecia!)
Íííh... Sujô (Hein?)
O inspetor!
(Acabou a farra, já pra sala do coordenador!)
Achei que ia ser suspenso mas era só pra conversar
E me disseram que a escola era meu segundo lar
E é verdade, eu aprendo muita coisa realmente
Faço amigos, conheço gente, mas não quero estudar pra sempre!
Então eu vou passar de ano
Não tenho outra saída
Mas o ideal é que a escola me prepare pra vida
Discutindo e ensinando os problemas atuais
E não me dando as mesmas aulas que eles deram pros meus pais
Com matérias das quais eles não lembram mais nada
E quando eu tiro dez é sempre a mesma palhaçada


Encarem as crianças com mais seriedade
Pois na escola é onde formamos nossa personalidade
Vocês tratam a educação como um negócio onde a ganância, a exploração, e a indiferença são sócios
Quem devia lucrar só é prejudicado
Assim vocês vão criar uma geração de revoltados
Tá tudo errado e eu já tou de saco cheio
Agora me dá minha bola e deixa eu ir embora pro recreio..."

(Estudo Errado, Gabriel o Pensador)




sexta-feira, 21 de junho de 2013

Quando a mudança acontecer, seus filhos e netos vão nos agradecer!

Resolvi me manifestar... Não porque estou apoiando os jovens nos manifestos, mas porque me considero uma pessoa bem politizada... Sempre votei com consciência, sempre escolhi a dedo meus candidatos, sempre fui petista porque considerava que os esquerdistas entendiam melhor as necessidades do povo. 
Sabemos da história, sabemos que os principais líderes dos movimentos que aconteceram no passado eram de partidos de esquerda. Querem que os cite aqui? PC do B, PSTU, PT, dentre outros. O próprio PSol surgiu de a partir de antigos partidários que encheram o saco das coisas que viam em seu partido, foi uma reação, por assim dizer. 
Nas últimas eleições presidenciais, votei na Heloísa Helena no primeiro turno. Votei mesmo. Porque ela é uma defensora do meio ambiente em primeiro lugar. E por outras razões que não preciso discorrer aqui. No segundo turno, votei na Dilma. Bom, o PT não foi de todo ruim... Fiz minha faculdade como bolsista e todos os meus estágios dentro do partido. Mas daí foi aí que a minha decepção começou... 
Para governador, votei no Tarso, dei um tiro no meu pé. O cara prometeu mudanças na educação, mas tudo o que fez foi rir na cara dos educadores. Ouvi e vi toda a bancada do PT se retirar da assembleia legislativa quando foram votar pelo pagamento do piso. Neste mesmo dia Paulo Odone e outros direitistas do governo falaram em favor do professorado, nunca pensei que viveria para ver isso!
O fato é que vivemos um governo populista, outrora protagonizado por Getúlio Vargas e hoje protagonizado por aqueles em quem acreditamos. Um governo que acolhe os ricos e joga migalhas aos mais pobres. Migalhas estas sustentadas por nós, classe média. Somos nós quem mantemos tudo com os impostos que pagamos. Sim, porque empresas de grande porte (e igrejas, diga-se de passagem) tem isenção de impostos neste país de merda porque geram empregos(?) - vale observar que são subempregos em sua maioria, porque grandes cargos já estão marcados e escolhidos a dedo. Mas, como promessas são o ópio do povo, vamos lá!
E aí eu vejo várias manifestações contrárias ao que tem acontecido... Pessoas comentando que o povo desconhece os 3 poderes, não sabe a quem recorrer... Peloamordedeus, gente, o que é isso? Se fosse assim tão fácil, teríamos mesmo de ir às ruas? Hoje fomos em frente ao palácio do governo em Porto Alegre e o nosso governador recusou-se a receber as lideranças sindicais que representam os professores. Será que adiantaria, simplesmente irmos aos locais  e tentarmos conversar? Agora tudo se tornou ilegítimo! 
A luta se tornou apartidária a partir do momento em que os líderes que antes empunhavam as bandeiras contra a corrupção se tornaram os corruptos. Simples assim. Eu não votaria mais no PT. Mas, tenho analisado candidatos e tenho votado em propostas e não mais em partido. Se algum candidato de direita tiver proposta coerente, eu voto. De boa. Porque o que está em jogo não é mais este ou aquele partido, mas a coerência entre discurso e práxis. 
Depois fizeram uma baita confusão entre os significados das palavras "apolítico" e "apartidário". Penso que todo mundo que está na rua sabe a diferença. O movimento não é apolítico, porque obviamente tem uma intenção política, não está na neutralidade. Mas pode ser apartidário, sim. Pelo motivo que expus acima e por tantos outros. 
O foco da luta é o fim da corrupção. O povo acordou porque está cansado. Hoje vejo tanta gente do PT questionando a legitimidade do movimento, mas, pergunto, se fossem partidos de direita no poder fazendo a mesma coisa, vocês não estariam nas ruas? Estariam! 
Aí estão falando que somos peças nos jogos midiáticos... O próprio governo não está vendido aos maiores veículos midiáticos do país (lê-se Rede Globo e RBS)? Quem assistiu o documentário Além de Cidadão Kane sabe que só é eleito neste país quem a mídia escolhe. Eles manipulam debates, manipulam estatísticas, manipulam nossas mentes pobres de informação. Mentes empobrecidas, aliás, pela própria programação. https://www.youtube.com/watch?v=049U7TjOjSA Este é o link do documentário, para quem não assistiu, assista, vão entender muitas coisas... Daí, nós, simples peças nos jogos midiáticos, devemos desacreditar quando a mídia fala de mensalão, mas, em compensação, devemos crer quando a mesma mídia fala de vandalismos e pinta uma imagem de criminalidade aos protestos, apoiando uma polícia que bate e não dialoga. Isto, sim, seria comparável aos tempos de ditadura militar, não seria? Penso que somos peças nos jogos de poder partidários, isso, sim. E estamos, finalmente, acordando. Vou falar que a cura gay, o investimento de bilhões na copa do mundo, a corrupção, a tentativa de retirar certos poderes do MP são motivos mais do que óbvios para que a massa combata. Sinto muito se a bola da vez é o PT. Eu saí da minha casa, sim. Não sou mais petista, a partir do momento em que percebi que o mesmo cara que assinou a lei do piso, o renega aos seus trabalhadores, a partir do momento em que percebi que há fragmentação de discurso dentro do próprio partido, onde linhas políticas antagônicas se espremem e se confrontam. Decepcionei-me, como muitos brasileiros. E como não estou satisfeita, fui às ruas, junto com a juventude. Estou ensinando política aos meus filhos deste modo porque eles estão lá comigo e sabem porque eu luto. Sou professora, militante das causas justas e politizada, sim. Por isso, exatamente por isso, que apoio o movimento! Porque o meu discurso não muda de acordo com o partido que está lá em cima. Ele segue sendo coerente com as coisas em que acredito. E, sinceramente, se continuarmos andando deste jeito, logo, logo, voltaremos ao tempo da perseguição às bruxas. Sou uma delas!

terça-feira, 28 de maio de 2013

Um pouquinho sobre surdez e educação


Certa vez, li em algum lugar que "é a capacidade de comunicar-nos que nos faz humanos". Aquilo me doeu. Não apenas porque tenho uma filha surda, mas porque tenho empatia, costumo sempre fazer o movimento de me colocar no lugar do outro, em qualquer circunstância. Isso me faz diferente de muita gente. Mas, na ocasião, lembro-me de ter-me sentido daquela forma por saber - intimamente - que muitos e muitos ainda vivem às margens de qualquer possibilidade de comunicação dentro de suas casas, com suas famílias. Estariam estas pessoas fora do conceito de humanidade dado por aquele autor? Serão enquadrados, então, como animais? Fiquei extremamente chateada...
Indo mais fundo, indo além, problematizando estas questões que permeiam a surdez, não nego que a linguagem, assim como o pensamento racional, é um dos elementos que nos conferem status de seres humanos, embora nem todos nós tenhamos a capacidade real de ostentar tal titulação. Mas o que fazer quando não temos uma? Quando somos tolhidos, podados, desde a mais tenra idade, da capacidade natural de comunicar-nos? Será que as pessoas pensam nisso?
A Júlia teve sorte. Claro que poderia ter tido mais, mais pessoas poderiam ter ido atrás para comunicarem-se com ela, mas ela teve alguém que se importou, que aprendeu, correu atrás. Desde pequena ela teve acesso a todas as informações possíveis, isso fez - e fará - toda a diferença na vida dela. Mas, desde que comecei a atuar como professora, passei a me perguntar todos os dias: E os outros? Isso me inquieta, me desacomoda, me consome...
Dentro da escola, atuando como intérprete, tenho a oportunidade de dar voz a estes sujeitos. Tenho a oportunidade de ser o som, de promover as trocas, de incentivar, de comover, de sensibilizar. Por isso que amo tanto o que faço. Não pensem que encaro isso como uma missão, uma espécie de boa ação, não, está bem longe disso. Sou uma profissional, mas que, diferente de outras profissionais da minha área, tenho um olhar pedagógico sobre o meu fazer diário. Isso me confere preocupações que outras pessoas não tem. Como a de construir conhecimento, por exemplo. Torná-los cidadãos críticos, capazes de se verem para além das suas deficiências. Aliás, nem considero que surdos sejam deficientes. Eles apenas tem um modo de ver e experimentar o mundo diferentes. São seres culturais, como todos nós, que tem uma cultura diferente da nossa.
Isso, meus amigos, me tornou simplesmente diferente também, no dia a dia. Não consigo aderir à lógica do "finge que aprende que eu finjo que ensino" e tudo certo. Quero que eles saiam daqui carregando algo para suas vidas. Que possam se ver fazendo coisas maravilhosas. Sou uma "plantadora de sonhos", por assim dizer. E não posso conceber que outras pessoas que atuam todos os dias com seres humanos não se vejam da mesma forma.
Diante de tantas e tantas reclamações sobre atuações errôneas de outras profissionais de minha área, que minimizam seus esforços, que preferem nem ficar em sala de aula, ou que ficam no celular durante as aulas, me pergunto: o que estão fazendo aqui, se não acreditam no que fazem? Queria mesmo saber. E entender.
As pessoas dizem que tenho esta sensibilidade por causa da minha vivência como mãe, mas eu digo: a sensibilidade e a empatia são coisas que carregamos conosco, ou temos, ou não temos, simples assim. Não foi minha graduação e nem o meu diploma que me deram a capacidade de me colocar no lugar do outro, isso é meu, já estava em mim, não é questão de formação e sim de caráter.
Ai, percebo certas coisas que estão imbricadas em todas estas questões: como formar caráter se não temos um? Como ensinar pelo exemplo se não podemos dar este exemplo? Por isso, exatamente por isso, que a educação está em crise de identidade. Ninguém mais sabe quem faz o que... Isso é triste. Se insistirmos que valores morais não estão atrelados aos conteúdos da escola, vejo um futuro negro pela frente. Porque conviveremos com cidadãos mal formados, mal informados e desprovidos de consciência. Vejam bem: não estou tirando as responsabilidades das famílias, de forma alguma. Mas vivemos em um momento da história em que alguém  terá de tomar partido. Mas também somos mal formados para trabalharmos com processos humanizatórios. E assim tudo vai se perdendo...
Tenho responsabilidades com meus alunos. E reconheço cada uma delas, cada vez que vejo seus olhares decepcionados. Tem intérprete que deveria ser presa. Tem intérprete que nem deveria ser intérprete. Assassinam sonhos todos os dias. Deixam que esses seres humanos continuem às margens dos processos de comunicação. Isso é um crime. Mas acontece todos os dias dentro das salas de aula inclusivas. Mas ninguém se responsabiliza. Porque vivemos na era do "ninguém tem culpa, mas todo mundo tem". Culpa do governo, que remunera mal e que tem critérios duvidosos na seleção dos profissionais, culpa da sociedade, culpa da comunidade escolar, culpa das famílias, culpa da igreja... E, nessa onda de culparmos todo mundo, vamos deixando que o tempo passe sem responsabilizarmos ninguém... É, a Júlia teve sorte...



segunda-feira, 1 de abril de 2013

Ser mãe...

Fui uma adolescente rebelde... Admito. E minha rebeldia, de certa forma, perdurou até os dias de hoje... Mas, ainda assim, reconheço e entendo os sacrifícios que minha mãe fez por mim... Até porque ela me lembrou disso durante um longo período de minha vida... Depois que fui mãe também, entendi que a maternidade de fato se resume a renúncias e sacrifícios. Somente aí que consegui perdoar a mim mesma pelo que fiz minha mãe passar... Entendo estas renúncias de uma forma diferente da que ela sempre entendeu e jamais culparia um dos meus filhos pelos sonhos que perdi no meu caminho, exatamente porque eles trouxeram outros sonhos com eles... 
Ser mãe é despojar-se, ser vulnerável todo o tempo, ficar desprotegida... Porque nosso corpo passa a não mais nos pertencer, partes dele passam a andar soltas por aí e, sabemos, caso algo aconteça com quaisquer uma destas partes, jamais voltaremos a ser o que éramos antes. Depois que fui mãe e minha história se cruzou, se alinhou, com as dos meus filhos, entendi que sacrifício não era somente o que minha mãe falava. Sempre gostei de tomar banho por último, sempre gostei de arrumar, cuidar da casa, isso nunca foi problema para mim... Sacrifício é muito mais do que isso. 
Claro que hoje não adiantaria discutir estas questões com ela, porque ela sempre, sempre pensará que se doou mais, que sofreu mais, que sua vida foi dez vezes mais difícil. Mas a questão que trago hoje é que, não importa quantas dores, não importa quanto sofrimento, não importa o número de coisas que tenhamos de renunciar, o que realmente importa é o olhar que damos a tudo isso. Tive uma filha surda, tive coragem de ter outro filho depois para que ela não ficasse sozinha, tive um casamento que durou muito mais tempo do que fora profetizado na igreja, muito mais tempo do que deveria ter durado... Fiz faculdade, batalhei para que a minha filha tivesse uma educação de qualidade, sendo que a escola dela não era a duas quadras da minha casa... Mas alguém me deve algo por tudo isso? Não! Caí, sacudi a poeira e segui adiante porque tinha dois motivos que me faziam acordar todos os dias e dar novos significados às minhas manhãs. Só eu sei quantas e quantas vezes pensei em desistir, mas, ao vê-los dormir, parei à porta e desfiz as malas... 
Hoje posso entender que também não devo nada à minha mãe... Porque ser mãe é auto sacrificar-se, é doar-se ao outro sem pedir nada em troca, esse é o significado do amor incondicional que devemos ter pelos nossos filhos. Assim como eu, Carina, jamais cobraria nada dos meus amados filhos, não permitirei mais que me seja cobrado. Cresci! Mas a rebeldia continua, mãe, como você pode ver! Assim como você, também travei lutas solitárias, também chorei muitas madrugadas e o que sofri em meu doce casamento foi muito, mas muito pior do que traição, do que abandono... Insisto em dizer que somos sozinhos em nossos sentires. Realmente o somos. Jamais irei me aproximar do que você sentiu assim como você jamais irá se aproximar do que senti. Mas a diferença entre nós duas é somente uma: eu me responsabilizei por minhas escolhas, cada uma delas, mesmo aquelas que fui influenciada a fazer. Você seguiu sua vida culpando os outros, inclusive a mim, talvez por ser a filha mais velha, talvez por realmente não poder cobrar do meu irmão por nunca ter feito muito por ele... (Muito embora já tenha ouvido você falar muitas vezes de quando ele quebrou o braço, de como recorreu a você.)
Mãe, talvez você precise dramatizar para se sentir realmente útil. Mas te digo que existem muitas outras maneiras de sentir-se assim. Dar comida aos animais de rua, um sorriso e um desejo de boa sorte àqueles que precisam de nossa ajuda e que por algum motivo não podemos ajudar naquele momento. E, desses, jamais poderemos cobrar aquilo que fizemos, porque o fazemos de coração, não buscando um lugar no céu. Porque recompensa, mãe, é o que se ganha quando se tem a consciência tranquila, a sensação de dever cumprido. Recompensa, mãe, é poder deitar a cabeça no travesseiro e adormecer tranquila, porque não há contas a serem pagas. Eu durmo tranquila, mãe, pode acreditar! Que bom que você também pode fazê-lo!

sexta-feira, 29 de março de 2013

Maternidade/paternidade é eterna!

Gostaria de escrever algumas linhas sobre a maternidade/paternidade. Pode parecer clichê, mas, dentro deste assunto, até o que parece óbvio não o é. Maternidade/paternidade é para sempre. Isso é óbvio, mas muita gente não pensa assim. Aliás, em dias de relações transitórias e prazeres momentâneos, até um assunto tão sério se torna modismo. 
Quando peguei o exame com a palavra "positivo" escrita nele, minha vida mudou, tomou outros rumos, cresceu em responsabilidades, nunca mais foi a mesma. Costumo dizer que nunca mais tive uma noite de sono profundo, como tinha antes, nunca mais. Qualquer barulho me faz acordar de sobressalto, qualquer gripe faz com que eu não fique tranquila fora de casa... Só tenho paz e sossego quando os tenho no ninho, embaixo de minhas asas. 
Quando me separei, fiquei com eles, eles passaram a ser a minha prioridade, nunca os envolvi em relações efêmeras, eles só conheceram pessoas que eu acreditei que seriam eternas em nossas vidas. Mas, enfim, todas as pessoas que conheci, sabiam da existência deles, sabiam do respeito que tenho por minha casa, sabiam que meus filhos sempre, sempre viriam em primeiríssimo lugar em minha vida...
Estou me manifestando a este respeito porque tem gente que acha que filho depois de criado não é mais problema de pai e mãe. Ou pior ainda, que quando ocorre a separação, os filhos são responsabilidade de apenas uma das partes. Que grande erro, que grande engano! Filho não deixa de ser filho depois que cresce. E ainda tem os netos, bisnetos, que coisa linda ser vô/vó parceiro! Não entendo como podem ter pessoas que abrem mão disso... 
Meus filhos estão moços, mas ainda pego no colo... Imagino-me com oitenta anos preocupada com eles com seus sessenta. Filho é filho, jamais deixará de ser... Para aqueles que se separam e se distanciam, tenho uma coisa a dizer: a vida traz a conta. Traz mesmo. Um dia você olha para trás e tenta voltar... O tempo não se resgata, tampouco o amor. 
Pai e mãe é para sempre, mas lembrem-se de quem é o adulto da história, quem tem que construir estes laços para que tenham continuidade no futuro... É uma grande responsabilidade. Por isso, meu amigo, minha amiga, pense bem antes de transar sem camisinha, pense bem antes de querer ter filho porque todos os casais estão pensando em ter. Filho é para sempre, não tem prazo de validade e sequer podemos desistir da aquisição quando as coisas não saem como esperávamos. Filho é o amor mais puro e incondicional que podemos sentir, mas nem todos estamos preparados para tanto... Só pense em ter quando você estiver, pense nisto!

terça-feira, 26 de março de 2013

Ser salva...

Então é assim, exatamente assim que era pra ser... Cresci acreditando em algo, alguma coisa que pudesse me resgatar, me tirar das velhas flanelas da infância. Durante muito tempo acreditei em heróis, fadas, duendes, o fantástico mundo que me absorvia nos momentos de solidão e desespero. Meu pai durante muito tempo fora meu herói... aquele por quem eu esperava ansiosa na janela da frente de casa, aquele que vinha me resgatar do quarto decrépito e mofado, com fraldas penduradas por todos os lados, móveis apertados... Mas muitas e muitas noites a espera era em vão. O mundo de fantasia que eu criava olhando para a rua, tentando reconhecer em cada farol aquele farol que iluminaria meus dias, acabava indo embora e eu tinha de voltar à dura realidade que me assolava. A velha cama e o sono do esquecimento, era, então, o meu destino.
Depois, muito depois, fui criando outras ilusões, outros mundos... Meu pai seguia sendo minha referência, mas não mais como antes... Já sabia que ele não me salvaria de nada, embora eu ainda quisesse...
Acabei acreditando que existiria alguém, um alguém que viria de longe e que me levaria, também, para longe. Tal qual vemos nos contos de fadas, projetei o tal "príncipe" em cada carinha com quem me relacionei desde então. Cada um foi uma possibilidade de príncipe perdida... Pior do que isso, foi uma parte de minha própria alma arrancada de mim mesma...
Durante muito tempo sonhei com o momento de ser salva. Muitas e muitas vezes me perguntava do que queria ser salva e a resposta era sempre a mesma: de mim mesma. Sim. De mim mesma. Sempre fui o meu próprio algoz... Difícil de entender... Até considero que, no fundo, o que eu queria mesmo era que alguém viesse e me entendesse... Entendesse esse meu instinto suicida e segurasse minha mão até mesmo quando eu acho que tudo está perdido por bobagem... 
É muito estranho olhar para trás e poder ver tudo isso. Desencantei... Como na música do Cazuza, hoje acho muito mais importante a "sorte de um amor tranquilo, com sabor de fruta mordida..." do que encarar os desafios de uma paixão sem limites. Tudo que esperei até hoje foi em vão... Aquelas histórias de filmes, de amores impossíveis, que requerem doação, dor, sofrimento jamais puderam existir. Nem lá fora e nem aqui dentro. Ter com quem dividir certos momentos é muito mais importante do que o frio na barriga, a vertigem e o medo do desconhecido.
Também aprendi a valorizar o momento. Sem expectativas, sem planos. Envelhecer junto? Ser amada e cuidada na saúde e na doença? Não. Definitivamente não. Histórias assim nem em filme mais. Não dá certo. Percebi que sou a responsável direta e única por minha própria felicidade. Fazer o que? Colocá-la nas costas de outra pessoa seria duro e cruel demais. Então vou criando meios alternativos de sobreviver em meio a tudo isto. O desencanto é parte do crescimento, apenas isso.
Alma Gêmea é marketing, coisa de quem precisa vender livros e histórias. Desculpem-me aqueles que acreditam. Desculpem-me as crianças e adolescentes que precisam destas e de outras ilusões, mas sinceramente, somos nós que fazemos dar certo ou não cada história. Não existe destino, existem escolhas. E não é tão simples assim. Não é. Desencantar-se é um processo bastante dolorido. Doeu demais em mim. Mas fui-me dando conta de que, a cada fracasso, a dor parecia maior porque tinha guardado a esperança, tinha acreditado que aquele podia ser ele. Ele. Aquele que ia me salvar, lembram? Tive de deixar de lado essa crença idiota. Tive de abandoná-la para conseguir sobreviver. Para conseguir emergir depois de cada mergulho profundo em mim mesma. Não foi fácil. 
Mas, enfim, não fiquei amargurada e nem nada. Sou feliz. Tenho momentos tristes, como todo mundo, mas sou feliz de um modo geral. Mesmo não sendo salva. Ou melhor, mesmo tendo de salvar a mim mesma. Vou dividindo minha vida e meus momentos com aqueles que se importam, com aqueles que não sentem necessidade de me modificar, que me aceitam com minhas inúmeras imperfeições e imensos abismos. Esses dias alguém me disse: "Gosto quando você se aproxima, fica mais carente..." Eu não gosto. Preciso da distância regulamentar que me separa do resto. Necessito do abismo... Mesmo que fique fora dele. Mas vou abrindo concessões e de vez em quando me deixo ser cuidada... Mas só de vez em quando. Porque aprendi a ser forte. Mas, acima de tudo, porque aprendi a não esperar nada... de ninguém!

segunda-feira, 25 de março de 2013

Dias de luta, dias de glória...

Não pude deixar de refletir sobre algumas questões que permeiam as práticas escolares, estes últimos dias tem sido de inquietações, muitas delas, sempre rondando minha alma... Com a obrigatoriedade de escrever meu artigo de finalização de pós graduação, muitos assuntos tem me vindo à mente, recorrentes, constantes e, principalmente, necessários de serem discutidos... 
Sou professora de sala de recursos e intérprete de Libras, mais intérprete de Libras do que qualquer coisa, mas professora, educadora. Educadora desde muito antes de carregar meu diploma. Como tal, tenho questionado muitas coisas pertinentes à escola. 
Outrora já me referi ao trabalho das TILs em sala de aula, sobre como sua atuação deveria ser pedagógica dentro destes espaços, uma vez que não acredito na neutralidade. Então, na sexta-feira passada, com a demora do ônibus que pego para retornar para casa, encontrei um grupo de surdos e fiquei conversando com eles, a maioria já conhecido por conta da trajetória que tenho com a minha filha. Regozijo-me com estes momentos. Fui para casa pensando no quanto faz diferença ser parte da comunidade, ser reconhecida por eles como parte do grupo, como militante na luta, na causa surda. 
Acredito que este seja meu diferencial, isso que me faz ficar mais próxima, entender as reais necessidades... Já discorri outrora sobre o que acho certo, sobre o que considero palpável na prática diária em sala de aula, mas essa discussão urge, arde, necessita ser fomentada para que a inclusão venha a ter alguma dignidade. 
Sinto que ainda há muito a ser feito e, sim, sou parte disso, você aí que pensa que nem tem nada a ver com essa história também é parte disso, porque essa gurizada que está na escola hoje são os profissionais que encontraremos amanhã nas mais diversas áreas. Então somos todos responsáveis pela herança que deixaremos. 
Tenho muito orgulho de minha trajetória, de tudo o que me trouxe até aqui, ostento as coisas em que acredito e os meus pensamentos como um estandarte a ser erguido nos dias de lutas... As batalhas serão árduas. Sei disso. Mas a minha construção é sólida e meus filhos, meus alunos, as pessoas que convivem comigo sabem o quanto tento ser honesta comigo mesma. Andar dentro das minhas possibilidades... 
Mas considero que ser parceira de caminhada, fazer construções e desconstruções junto dos meus alunos é parte do mega projeto aprender/ensinar... Esse é o principal diferencial. Já dizia Freire que a gente aprende ao ensinar e precisamos estar sempre abertos e atentos para isso. Confio na potencialidade do meu aluno e acredito muito que podem ir além, sempre! Longe do conceito inicial de aluno (que significa "sem luz") porque hoje ele tem um papel social que está muito além disso. O meu papel segue sendo guiar... orientar... aprender e apreender com eles, cada vez mais! Reconhecendo que os dias de glória que se seguirão serão marcos na história, na história de nossas vidas, das instituições de ensino e, principalmente dos movimentos de governamento e governabilidade a que estamos sujeitos. Para que no futuro a inclusão seja parte disso tudo, de forma digna e coerente, não apenas uma utopia, um passo dado no escuro.

terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Vida e morte


Queria escrever algumas linhas sobre o final do ano... Passamos, enfim, por mais um prenúncio de fim de mundo... ilesos... Mas será que estamos mesmo ilesos? O mundo não acabou - ainda - mas gostaria de dimensionar o quanto estamos ilesos, o quanto estamos a salvo de nós mesmos. 
Vivendo em um planeta em que as pessoas estão cada vez mais egocêntricas, etnocêntricas e arrogantes, pessoas desumanizadas que não conseguem ver além de seus gramados e de seus umbigos... Enquanto a escola se esquiva de fazer seu papel humanizatório, vamos nos perdendo em meio a tanta atrocidade e mediocridade. Estamos vivos? Estamos protagonizando nossas vidas, nossas histórias? O que temos feito para que não passemos por aqui em vão?
Difícil falar sobre estas questões, mas, enquanto a programação da tv nos aliena, enquanto ficam na internet bisbilhotando as vidas alheias e se importando com o que é visto, o que acontece lá fora é a vida... sim, a vida... Independente de você participar dela ou não, ela está lá. Vibrando, colorindo, extravasando, sorrindo... com ou sem você!
E, um dia, como neste último domingo, você se dá conta de que a vida é tão efêmera e frágil... escorre por entre os dedos da gente, feito a areia de uma ampulheta. Você percebe o quanto é importante dizer o que sente, ser sincero - consigo mesmo - e cultivar os amores... Porque pode ser a última vez que você vê aquela pessoa... Pode ser a sua última chance de dizer que a ama, ou que ela o magoou. 
A Morte espreita a todos nós... Com este incidente em Santa Maria, em que morreram mais de 200 jovens, fiquei me perguntando, para quem eu mandaria a primeira mensagem, na eminência de minha morte? De quem eu gostaria de me despedir, de tranquilizar com a minha ida? Fiquei pensando, em meio a minha confusão e tristeza, que talvez - talvez - eu tenha tentado ir embora tantas vezes pelos meus próprios meios por causa da despedida. Para que eu pudesse me despedir de quem amo, dizer adeus, dizer que estaria melhor lá do que aqui... Não queria ser surpreendida por ela. Não queria que ela me levasse em um momento feliz, como fora profetizado outrora... Queria ir com a certeza de que deixei quem eu amo com as palavras certas...
Mas não controlamos isso. Não podemos conversar com a Morte e dizer: "Volte depois, ok? Tenho muito por fazer ainda!" Quantos aquele dia nem puderam despedir-se, talvez porque pensaram que sobreviveriam, talvez pelo simples fato cotidiano de não terem crédito em seus celulares... E, nesses momentos, em que nos sentimos tão pequenos frente ao acaso, é que aprendemos a dar mais valor às pequenas coisas, aos detalhes... Comecei a sorrir à toa lembrando do abraço tão natural do meu filho, vendo minha filha dormir, o amor de meus gatos por mim. Viver não é fácil... concordo... o mundo anda muito complicado, como cantou Renato (Russo) uma vez... Mas morrer também pode não ser um alívio... Principalmente quando deixamos alguém que sentirá por nós... Que saibamos valorizar cada momento, cada minuto junto de quem amamos, que saibamos valorizar a vida, pura e simplesmente, com seus altos e baixos e desafios constantes... Abrace, sorria, beije, quebre regras e seja feliz hoje, agora, porque o presente é a única coisa concreta que temos!




Quero deixar registrado o meu respeito e sentimentos relacionados ao ocorrido... muita coisa já fora escrita a este respeito e esta é apenas mais uma... Mas o último domingo fora o mais estranho de todos... sem nenhuma paz... 


Apenas mais uma de amor



A gente quase completou um ano de namoro, quase. Faltou um mês ou um pouquinho mais, não lembro. Mas hoje, sem mais nem menos, completamos um ano de separação. Ano passado essa hora, exatamente a essa hora, eu lembro bem. Eu estava no show do U2 que você não quis ir comigo e me ocupava em perguntar, de dez em dez segundos, e de dez em dez pessoas, quando é que você iria me ligar e dizer que tinha pensado melhor. Quando? Você nunca ligou, nunquinha. E eu esperei, esperei, esperei tanto tempo, nossa, como eu esperei. Acho que eu nunca esperei tanto nada em toda a minha vida. Outro dia a Myla me perguntou o que você tinha me ensinado. A gente estava conversando sobre os legados que as pessoas deixam em nossas vidas e ela quis saber qual tinha sido o seu. O coiso me ensinou a gostar de MPB e cinema europeu, o outro coiso me ensinou a gostar de sexo e restaurante caro. Teve o coisinho que me ensinou a ser engraçada e jogar frescobol. E você? Que raios me ensinou? Fiquei sem saber na hora, fiquei sem saber o que responder para a Myla. Mas hoje, no nosso aniversário de um ano separados, posso dizer que foi você quem me ensinou a lição mais importante da minha vida: você me ensinou a sofrer. Eu nunca, nunca, em vinte e sete anos de vida, tinha sofrido. Nunca. Claro, eu odiava ver meus pais quebrando o pau quando era criança, mas eu lembro que eu, pequenininha, pensava: um dia um príncipe vai me levar para longe dessa casa com gente louca que fuma demais, berra demais, desmaia e chuta vasos. Eu sofri também na escola, quando para alguém me enxergar eu tinha de promover bizarrices. Mas eu era muito nova para me separar das bizarrices e acabava também chamando a minha atenção: será que eu sou bizarra? Depois, em casa, quando eu dobrava direitinho o uniforme para o dia seguinte e me sentia um papel de parede bege que ninguém entende pra que serve, eu pensava: um dia um príncipe vai me levar pra longe dessa falta de vida, dessa falta de beleza, dessa falta de compreensão, dessa falta de cor, dessa falta de sei lá o que porque eu era novinha demais pra saber o que faltava. Esperar o raio do príncipe sempre disfarçou minha dor, sempre me refugiou dela. Mas quando você, no dia 20 de fevereiro de 2006, me mandou seguir meu caminho sozinha, fiquei sem saber como fugir da dor. Você era meu príncipe. Depois de tantos amores estranhos, pequenos, errados e tortos, finalmente eu tinha reconhecido no seu olhar centralizado e no seu sorriso espalhado, o meu príncipe. E o meu príncipe estava me dando o fora. Que porra eu ia esperar da vida agora? Quem iria me levar para longe se você não me queria mais por perto? Não teve como. Foi a primeira vez na vida que não consegui me enrolar e acabei deixando a dor vencer. Pela primeira vez a realidade falou mais alto que a fantasia. Pela primeira vez a realidade da sua ausência falou mais alto que a fantasia de anos a sua espera. Sofri pra caralho, como diz por aí quem sofre pra caralho. Mais do que livros cabeças, músicas bacanas, frases inteligentes, lugares descolados ou posições sexuais, você me ensinou o que realmente importa aprender nessa vida: que a vida pode ser uma grande, imensa e gigantesca merda. É, ela pode ser. E que não existe porra de príncipe porra nenhuma. Que nem ninguém e nem nada pode te levar para longe de nada. É isso e pronto. E é assim pra todo mundo. E pronto. Qual o drama? A dor infinita dos dias infinitos que vieram depois do dia em que você se foi pra sempre veio misturada com toda a dor que eu não senti em todos esses anos.A dor infinita dos dias infinitos que vieram depois do dia em que você se foi pra sempre veio misturada com toda a dor que eu não senti em todos esses anos. A dor do seu pé na bunda trouxe vasos jogados, bitucas eternas de cigarros em longas discussões pesadas, tardes perdidas em odiar o mundo, cabeças viradas, corredores frios, papéis de parede beges e grupinhos festivos e fechados. A nossa dor acabou sendo toda a dor que fazia fila em mim para ser sentida. E já que a porta pra realidade estava aberta, por que não sofrer também pelas criancinhas carentes, os países em guerra, a estupidez humana e a dor das juntas da minha mãe? Por que não sofrer pela condição das favelas, das prisões e da Terra? Por que não temer o aquecimento global, o ácido dos limpadores de vidro na Henrique Schaumann e as frases do Clodovil? A dor da sua partida trouxe toda a dor do mundo. De uma só vez. Mas agora já passa da meia noite. Não é mais nosso aniversário de fim e, pra te falar a verdade, eu já não sofro mais o nosso fim faz tempo. E pra te falar ainda mais a verdade, eu acho mesmo que você foi o príncipe que eu esperei a vida inteira. Você chegou e me levou embora. Levou embora a menina que tinha medo de sentir a vida e esperava uma salvação para tudo. Quem sobrou é essa desconhecida que se conhece muito bem em suas bizarrices, lê jornais todos os dias, substituiu o bege pela cor do verão, tem uns pais gente boa ainda que malucos, adora os poucos e estranhos amigos, não espera mais pelo cavalo branco mas fica ansiosa pelo início da novela e talvez esteja pronta para amar de verdade. Amar um homem e não um príncipe.