terça-feira, 20 de outubro de 2020

Clonazepan 2mg


Estou em terapia já faz mais de ano. Aliás, voltei a ela, depois de anos me virando como dava... Um remédio aqui, um fitoterápico ali, chá, ritual, simpatia e, de repente, percebi que não ia conseguir sozinha - de novo. 

Mas comecei a terapia talvez meio tarde e as crises já estavam intensas demais e a dor, a velha e conhecida dor, não esperou a cura, teve urgência em ir embora... 

Daí foi um pulo pra mais uma tentativa de "voltar pra casa"... É incrível que toda vez que tentei o suicídio, me lembrei das dores antigas, além das novas... 

A Carina criança, abusada, esperando pelo pai na grande janela, as perninhas balançando pra fora, o tempo, o pai que não vinha, a desilusão... A Carina adolescente, que ñ tinha lugar no mundo pra ela. Melhor aluna. Pior pessoa. Habilidades na escrita, no desenho, na solidão... 

Aí, nesses momentos, sempre almejava o glamour dos pulsos cortados, o sangue, a dor punjente em quem outrora me machucou. Mas tudo que tive foi o veneno, o remédio, o vômito e a volta vergonhosa a esse mundo que não queria mais ficar. 

Eu queria não ter de assumir fracassos. Tão inteligente, desde pequena, tão talentosa, mas incapaz de construir algo que fosse concreto: seja relacionamento ou patrimônio... Ir embora é muito mais difícil que ficar. Mesmo que ficar signifique olhar no espelho todos os dias e sentir-se insignificante. 

E tentei de tudo pra me sentir mais gente: emagrecer, academia, dietas e chás milagrosos, pensamento positivo, como todo mundo fala, ocupar minha vida com horas intermináveis de trabalho. Nada, absolutamente nada preencheu o vazio. 

Tenho amigos, filhos, uma parte da minha família que me é essencial e importante, então o que acontece? Nunca soube explicar. Desde os 16 anos fazendo terapia, tomando remédios, tentando me enquadrar num mundo que cada vez mais se distancia daquilo que acredito... 

E, acreditem, o faço por vocês. Para não ter que ver olhares decepcionados me perguntando: "nosso amor por ti não basta?" Mas não é sobre amor. É sobre dor. E às vezes é tanta dor... É a falta de grana, é o trabalho triplicado pra não ter adquirido quase nada, é a crise com o filho, são as contas não pagas, é o não saber o que vamos comer amanhã (sim, às vezes acontece!) É tanta coisa que dói. 

E, hoje, com a incerteza provocada pela pandemia, agrava. Meses sem ver ou abraçar amigos, sem sair pra lazer, somente pra trabalho. O medo de trazer a doença pra minha filha que espera meu neto... Sem poder sequer imaginar o futuro. Ou se estaremos ali, logo adiante... 

Preciso ocupar minha mente, mas não estou dando conta nem do que tenho para fazer e isso agrava a ansiedade, que agrava a depressão e, enfim, já nem sei mais o que é melhor. Ou menos pior. Vou levando... Desistindo de alguns projetos aqui. Planejando outros ali... Que nem sei se vou por em prática... Mas, né, a gente vai tentando. 

Vou agradecendo a quem se preocupa, a quem me estende a mão, minha mãe, meu irmão, minha filha, alguns amigos que conseguem - ainda - ler meus sinais e me segurar pra que não me perca de mim mesma. 

Eu tô tentando, juro que tô. Mais por vocês que por mim. Mas de noite, no travesseiro, ou no banho, a batalha é só minha. E tenho sido forte! Vocês se orgulhariam! Mas agora, que o Rivotril bateu bonito, vou dormir, porque, acreditem, é o único momento em que minha mente tão barulhenta encontra paz. Já chorei o bastante por hoje. Amanhã tem mais. E vamos indo, um dia depois do outro. 

Desculpem os lamentos, sei que quem tem coração também tá fodido da cabeça. Não estamos sozinhos, teoricamente. Praticamente, estamos. Fodidos e sozinhos. E o clonazepan é um baita companheiro! Acreditem! Cada um com sua droga... 


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