segunda-feira, 3 de outubro de 2016

Sr. Gandalf, o cinzento



Foi num final de tarde de um dia de verão... Eu chegava do trabalho, num dia em que nada fora do comum havia acontecido, um dia como qualquer outro... Não sei se fui eu quem o encontrou ou se fui encontrada por ele... Mas o fato é que foi ele quem se fez ver, com seu miado estridente, miado de filhote. Não parou de miar enquanto eu o buscava pela rua freneticamente, mas veio quando eu o chamei e encontrou alento no meu colo. 
Em silêncio, foi até em casa comigo, no colo, quieto, como quem encontrara a paz e como quem soubesse que era ali, exatamente ali, que deveria estar. Chegando em casa, enfrentou certa resistência de seus irmãos, mas logo era parte da família. Era o ranzinza, o "na dele"... Gostava mesmo era de dividir a comida com os humanos...
Gato cinza, do pelo de veludo, dos olhos verdes brilhantes, era um gato forte. Passou por duas mudanças com a gente e nunca teve uma reação ruim. Mas, em compensação, nunca superou muito bem a perda do mano Kowalski. Até pouco tempo ainda ficava por tempo interminável olhando pelas janelas, miando na sacada, como quem chama alguém importante. E ele nunca voltou... E agora tu nunca vais voltar... Mas quero crer que vocês estão juntos, onde quer que estejam, esperando por nós, esperando pelos seus irmãos...
Desde o dia em que tu adoeceu meu coração se partiu em mil pedaços. Ver o brilho dos teus olhos apagado pela dor foi muito triste para mim e teus irmãos humanos. O sentimento de impotência, o resquício de esperança de que tudo pudesse melhorar... Como dizem, um pedaço de mim, de minha alma, foi contigo. E deixaste comigo um pedaço da tua. Espero viver tempo suficiente para que, um dia, eu me torne toda felina, ou metade felina e metade canina e não reste mais nada humano em mim. 
Também dizem que os gatos escolhem os donos. Acredito mesmo nisso. Sou abençoada por ter sido escolhida por tantos seres de luz. Sinto-me regozijada por saber que, naquela tarde quente de verão, passei a fazer a diferença na tua vida. Assim como fiz e faço a diferença nas vidas de tantos outros e queria fazer ainda mais, mas não posso. 
Ao longo destes anos em que estivemos juntos, foram muitas coisas vividas, muitas sonequinhas à tarde, muitos filmes no colinho, muitos sanduíches divididos e muitos pedaços de frango roubados... Tu eras o guardião da cozinha... Hahaha... Até agora ainda não acredito que vou chegar em casa e não vou te ver no móvel ao lado da porta, esperando para dar aquela espiada marota para fora, esperando para ganhar o cafuné sagrado... Não caiu a ficha, amigão! O Snape está inconsolável. Anda pela casa só dormindo os dias inteiros. Acho que ele não está entendendo muito o que aconteceu.
Arrependo-me de não tê-lo deixado dormir no côncavo de minhas costas nas últimas noites. Arrependo-me de não ter te dado mais tempo em meu colo, sempre atarefada entre uma coisa e outra... E essa lição levarei adiante para os teus irmãos que ficaram: nunca deixar para depois o carinho, nunca procrastinar o amor. Porque simplesmente não sabemos quando será a última vez, quando será o último suspiro. 
Disseram que tu estás muito melhor do que nós, que ficamos. Até acho que sim. Mas queria mais um tempo contigo. Queria que a cirurgia tivesse dado certo e que tivéssemos o brilho dos teus olhos por mais um tempo. Queria ter podido dizer adeus, como disse ao teu irmão, que ainda ronronou pra mim no último suspiro... Tá doendo, cara! Não teve um só dia em que eu não tenha lembrado e chorado a tua falta... E vai ser assim sempre... As lembranças permanecerão.
Já fiz uma combinação com os deuses de que, quando for a minha vez de partir, que eu vá pro céu dos bichos. E deve ser um lugar muito mais legal do que o outro céu. Cheio de novelos de lã, cadarços e um monte de coisas legais. Deve ter um gramado enorme e muita areia limpa... Esperem por mim, tu e teus irmãos. Agora tu podes dormir junto com o Kowalski de novo. Não deixa ele e Sr. Frodo brigarem. Logo, logo eu tô chegando por aí. E o reencontro, ahhh, esse é certo para aqueles que se amam! Até logo, Sr. Cinzento! 



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