sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Sabina, por Anaïs Nin


"Por que sou amada por ele? Será que ele continua me amando? Seu amor é por algo que não sou. Não sou suficientemente bela, não sou boa, não sou boa para ele, ele não deveria me amar, eu não mereço, vergonha, vergonha, vergonha por não ser suficientemente bela, há tantas outras mulheres muito mais belas, com rostos radiantes e olhos claros. Alan diz que meus olhos são lindos, mas não posso vê-los, para mim eles são olhos mentirosos, minha boca mente, há apenas algumas horas estava sendo beijada por outro. Ele está beijando a boca beijada por outro, está beijando olhos que adoraram outro... vergonha... vergonha... vergonha... as mentiras... as mentiras... As roupas que ele está pendurando para mim com tanto cuidado foram acariciadas e amarrotadas por um outro, um outro que era tão impaciente que amarrotava e puxava meu vestido com violência. Não tinha tempo para me despir. É esse o vestido que ele está pendurando com carinho. Posso esquecer o dia de ontem, esquecer a vertigem, essa selvageria, posso voltar para casa e nela permanecer? Às vezes não consigo suportar as rápidas mudanças de cena, as transições rápidas, não consigo fazer calmamente as mudanças de um relacionamento para o outro. Algumas partes de mim são arrancadas como um fragmento, voam aqui e ali. Perco partes vitais de mim, uma parte de mim permanece naquele quarto de hotel, uma parte de mim afasta-se deste local de abrigo, uma parte de mim está seguindo um outro enquanto ele desce a rua sozinho, ou talvez não sozinho: alguém pode tomar o meu lugar ao seu lado, enquanto estou aqui, esta será minha punição, e alguém ocupará o meu lugar aqui quando eu partir. Sinto-me culpada por deixar cada um deles sozinho, sinto-me responsável por eles estarem sozinhos, duas vezes culpada com relação a ambos os homens. Onde quer que esteja, estou em muitas peças, sem ousar juntá-las, assim como não ousaria juntar os dois homens. Agora estou aqui, onde não serei ferida, pelo menos durante alguns dias não serei ferida de maneira alguma, por nenhuma palavra ou gesto... mas não sou toda eu que estou aqui, apenas metade de mim está sendo protegida. Bem, Sabina, você fracassou como atriz. Você rejeitou a disciplina, a rotina, a monotonia, as repetições, qualquer esforço sustentado, e agora tem um papel que precisa ser mudado a cada dia para proteger um ser humano do sofrimento. Lave seus olhos mentirosos e seu rosto mentiroso, vista as roupas que ficaram em casa, que são dele, batizadas por suas mãos, interprete o papel de uma mulher inteira, pelo menos você sempre desejou ser isso, não é uma mentira completa..."



Anaïs Nin, Uma Espiã na Casa do Amor

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