"Nessa noite, recordou-se dos banhos de lua, como se isso tivesse marcado o início de sua vida, em vez dos pais, da escola, do lugar de nascimento. Como se eles tivessem determinado o curso de sua vida mais do que a herança ou imitação dos pais. Nos banhos de lua talvez estivesse a motivação secreta de seus atos.
Aos dezesseis anos, Sabina tomava banhos de lua, sobretudo porque todos os outros tomavam banhos de sol e, em segundo lugar, reconhecia ela, porque lhe haviam dito que era perigoso. Era desconhecido o efeito dos banhos de lua, mas se insinuava que podia ser o oposto dos efeitos do sol.
Estava amedrontada na primeira vez em que se expôs. Quais seriam as consequências? Havia muitos tabus contra se olhar para a lua, muitas lendas antigas sobre os efeitos malignos de se dormir ao luar. Ela sabia que a lua cheia era agudamente perturbadora para os loucos, que alguns deles retomavam aos hábitos animais de uivar para a lua. Sabia que na astrologia a lua governava a vida noturna do Inconsciente, invisível à consciência.
Mas então ela sempre preferira a noite ao dia. O luar caía diretamente sobre sua cama no verão. Ela ficava deitada nua ao luar, durante horas, antes de cair no sono, perguntando-se o que seus raios iriam fazer-lhe à pele, ao cabelo, aos olhos e, depois, mais profundamente, aos sentimentos.
Nesse ritual, parecia-lhe que a pele adquiria um brilho diferente, um brilho noturno, uma luminosidade artificial que somente apresentava seu mais pleno fulgor à noite, na luz artificial. As pessoas percebiam isso e lhe perguntavam o que estava acontecendo. Algumas sugeriam que ela estava usando drogas.
Isso acentuava-lhe o amor ao mistério. Ela meditava sobre este planeta, que mantinha metade de si no escuro. Sentia-se ligada a ele porque era o planeta dos amantes. A atração que sentia por ele, o desejo de banhar-se em seus raios explicavam sua repulsa a ter um lar, marido e filhos. Começou a imaginar que conhecia a vida que tinha lugar na lua. Sem lar, sem filhos, com amantes livres, nem mesmo ligados um ao outro.
Os banhos de lua cristalizaram muitos dos desejos e orientações de Sabina. Até este momento, ela experimentara apenas uma simples rebelião contra as vidas que a cercavam, mas então começou a ver as formas e cores de outras vidas, reinos muito mais profundos, estranhos e remotos a serem descobertos, e percebeu que sua recusa à vida comum tinha um propósito: despachá-la qual foguete em direção a outras formas de existência. A rebelião era apenas a fricção elétrica acumulando uma carga de energia que a lançaria no espaço.
Compreendeu por que se irritava quando as pessoas falavam da vida como sendo uma. Tinha certeza de miríades de vida dentro de si. Seu sentido de tempo alterou-se. Sentiu vividamente e com aflição a brevidade do período físico da vida. A morte encontrava-se terrivelmente próxima, e as jornadas em direção a ela eram vertiginosas, mas somente quando levava em consideração as vidas a sua volta, aceitando-lhes os horários, relógios, medições. Tudo o que faziam contraía o tempo. As pessoas falavam de um nascimento, uma infância, uma adolescência, um romance, um casamento, uma maturidade, um envelhecimento, uma morte e, então, transmitiam o ciclo monótono a seus filhos. Mas Sabina, ativada pelos raios lunares, sentia germinar dentro de si o poder de entender o tempo nas ramificações de uma miríades de vidas e amantes, para expandir a jornada para o infinito, fazendo imensas e voluptuosas voltas como cortesã depositária de múltiplos desejos. As sementes de muitas vidas, lugares, de muitas mulheres dentro de si foram fecundadas pelos raios lunares, porque vinham desta vida noturna ilimitada, que geralmente percebemos apenas em nossos sonhos, os quais contém raízes que se estendem a todas as magnificências do passado, transmitindo os ricos sedimentos ao presente, projetando-os ao futuro."
Anaïs Nin, mais um trecho do livro Uma Espiã na Casa do Amor.
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